Penso que há aqui muitas reacções extremadas ao jogo de ontem, talvez motivadas pela enorme frustração de uma vez mais termos deitado fora a liderança. Os grandes parecem estar a fazer todos os esforços possíveis para perderem este campeonato.
O jogo foi marcado por uma enorme infelicidade e por alguns erros próprios. Os primeiros 20, 25 min. mostraram um Sporting decidido e a trocar bem a bola. O jogo não estava resolvido ao quarto de hora porque não calhou: produzimos futebol para isso.
O Martins esteve compreensivelmente abaixo do normal, o Enak mostrou ser o único defesa indiscutível (uma boa contratação, há que dizê-lo). Tivesse o Liedson concretizado apenas uma das oportunidades que teve, e outro galo teria cantado. A este propósito, quem fez viagens transatlânticas que diga se no dia seguinte estava a 100% para jogar à bola… Falo por mim: nem de xadrez, quanto mais de futebol.
No mais, não concordo com as lapidações a alguns jogadores:
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Rogério: não tem o dom da ubiquidade como o Custódio, mas fez ontem o seu melhor jogo como trinco;
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Rochemback: péssimo no passe, mas teve iniciativas importantes na primeira fase de pressão. Se depois baixou de rendimento era tirá-lo, que as substituições servem para isso. O instinto de conservação do esfíncter é uma coisa fortíssima… 
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Barbosa: provavelmente já terá sido louvado como génio em jogos nos quais se entregou muito menos que ontem. Esteve muito em jogo, embora desastrado na conclusão dos lances. Esteve desinspirado e acabou com os bofes de fora. E no entanto estava em campo quando soou o apito. Vá lá saber-se…
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Tello: não deve haver neste fórum quem o aprecie menos do que eu. Entrou a jogar o que sabe- pouco-, mas fez um cruzamento perfeito para a cabeça do Liedson, que atirou por cima. Se tivesse sido golo louvava-se a utilidade do Tello e forma como é decisivo sempre que entra.
O meu MVP é de longe o Sá Pinto, o jogador a quem a camisola incendeia o coração. O último fôlego do seu pulmão tem mais força que a mais enérgica baforada de um Barbosa, Roca ou Rui Jorge. Era o mais inconformado, o que mais corria, o que mais tentava, o que mais lutava; era, mais importante que tudo, o único que estava a conseguir ligar o meio campo com o ataque. E saiu.
O seu “f***-*e!” ao ver a placa terá sido o de muitos adeptos, e eis que chegamos a esse problema chamado Peseiro.
Há que notar que este treinador pôs a equipa a jogar futebol. Notam-se-lhe princípios de jogo, uma filosofia e um saudável apetite pelo ataque. Mas se as debilidades defensivas ainda podem ser levadas à conta de um excepcional balanceamento ofensivo (o que não invalida que, nesse caso, sejamos apenas “meia equipa”), já se torna mais difícil explicar a ineptidão do Peseiro na condução do jogo a partir do banco, de que o derby em casa com os lamps foi a feliz excepção.
O Peseiro faz-me lembrar o Queiroz e o Jozic. Durante a semana mostra proficiência técnica, imprimindo à manobra da equipa o cunho desejado, e depois durante os jogos é muitas vezes ele próprio a hipotecar o trabalho do grupo, com receios e indecisões, traduzidos em substituições tardias e/ou mal feitas.
Em cima disto o Peseiro manifesta ainda alguma inabilidade na gestão mediática pós-jogo (escusada, por ridícula, a cena com o repórter da SportTv), e, continua a parecer-me, uma grande dificuldade em tirar do onze ou mesmo substituir alguns nomes.
Numa coisa lhe dou o meu crédito: não sendo possível ganhar títulos, por infelicidade ou por falta de opções no plantel, ao menos que se jogue futebol de qualidade e entusiasmante. Não será inteiramente certo, como diz o treinador, que “quem joga assim está sempre mais perto de ganhar”, e aí está o Sporting a demonstrá-lo, com apenas mais um ponto que os outros grandes, que lhe são bastante inferiores em futebol. Mas pelo menos, não ganhando, assiste-se a bons espectáculos, e isso é mais do que o Boloni e o Timex se podem gabar.
Termino com a questão do Ricardo. Penso serem profundamente injustas as apreciações ao golo do Setúbal que lhe endereçam as culpas. Mais lamentável ainda é constatar que essas apreciações se enquadram num processo de pura e simples confrontação de quem foi contra a utilização do Tiago no jogo da Taça, o que faz imaginar que pode haver sportinguistas a desejar que o Ricardo dê frangos apenas para poderem vir aqui exibi-los como “troféus”.
Analisemos o lance: um único avançado, a 35 metros da baliza e apertado pela defesa, tem que dominar uma bola lançada das suas costas. E o Ricardo teria que estar na linha de golo, à espera do remate iminente… :shock:
Comparar este lance com o 3º golo dos lamps só pode ser brincadeira: neste o adversário levava a bola dominada por um corredor aberto na defesa, e rematou para aí a metade da distância. O Tiago, para além de adiantado, fez-se à bola com o grau de decisão que faz dele o grande GR que é. A bola passou-lhe a centímetros da cabeça…
O Ricardo não é perfeito e aliás ontem ia dando buraco, num lance salvo pelo Enak, mas no lance do golo estava onde devia estar, atentas as circunstâncias. Se um defesa fizesse o desarme, teria uma linha de passe; se o avançado ganhasse a bola e corresse para a baliza, ele podia antecipar-se. Aconteceu assim, por alguma cerimónia da defesa e por inspiração do avançado. Também há que reconhecer o mérito quando ele aparece.
Quero acreditar que as apreciações feitas resultam também elas de um sentimento de frustração, até porque a alternativa seria admitir a hipótese de haver foristas intelectualmente desonestos e movidos de má fé.
PS- A única conclusão definitiva que tirei do jogo de ontem foi que o Miguel Garcia não serve para jogar no Sporting.