Uma das problemáticas mais presentes nas épocas recentes do Sporting tem sido o assobio, neste caso aos próprios jogadores da equipa que os adeptos deveriam, supostamente, apoiar. As posições tradicionais em relação a este tema têm sido polarizadas, isto é, de um lado da barricada estão os adeptos que concordam com este comportamento e do outro os que não concordam. Os que concordam defendem que o assobio é uma forma legítima de expressão, neste caso em relação à falta de qualidade futebolística muitas vezes apresentada no Estádio de Alvalade. Os que estão contra o assobio não concordam que um adepto presente no estádio possa adoptar uma medida comportamental que tem efeitos nefastos nos jogadores, não os ajudando a superar as adversidades com que se deparam.
No entanto, mais do que adoptarmos uma posição extremista, é importante perceber a génese deste comportamento. Porque é que no Estádio de Alvalade se envereda mais facilmente pelo assobio quando as coisas não correm bem? Com isto não quero afirmar que não se faz o mesmo na casa dos rivais, até porque o famoso “tribunal das Antas” também manifestou, num passado recente, este tipo de medida contestatária. Porém, parece-me evidente que o assobio surge muito mais rapidamente em Alvalade do que nos outros campos do país, basta ver aquilo que sucedeu com Rui Patrício no jogo com os dinamarqueses. Qual será, então, a razão por detrás disto?
Em primeiro lugar, temos que definir o que é um assobio neste contexto futebolístico. Parece-me evidente que é um comportamento de protesto, derivado da frustração que os sportinguistas sentem quando a equipa não ganha. Estará, então, associado a sentimentos internos de frustração. Ora bem, então se o assobio é um reflexo da frustração interna dos adeptos, qual será a razão para que se manifeste tão recorrentemente e qual a causa desta frustração? Para respondermos à questão sobre a frequência e causa do assobio, é necessário reflectir sobre as causas da frustração na espécie humana.
A frustração é um sentimento que surge quando não se consegue atingir um determinado objectivo. O senso-comum diz-nos que a frustração ocorre porque as pessoas não aprenderam a lidar com ela. Neste caso, as crianças mimadas que fazem birras constantemente não aprenderam a lidar com este sentimento porque, na realidade, nunca foram suficientemente frustradas pelos pais. No entanto, a ciência mostra-nos que ocorre precisamente o contrário: quanto mais uma criança é frustrada, menos capacidade terá para lidar com a frustração. Isto é, crianças que são continuamente frustradas não têm a capacidade necessária para conseguir lidar com o facto de não conseguirem atingir os seus objectivos, seja um gelado ou um brinquedo que vêem no supermercado. O resultado desta incapacidade pode-se reduzir a dois tipos de comportamentos: os agressivos e os depressivos. Os agressivos são as birras, os gritos, o “pedinchar” constante ou até mesmo a agressão. Os depressivos são mais difíceis de quantificar, porque neste caso a criança vira a agressividade para dentro, internalizando-a, o que pode originar a formação de personalidades depressivas no futuro. Por isso é que se considera que, apesar de tudo, os comportamentos agressivos são mais saudáveis.
Com isto quero demonstrar que o assobio constante não é mais do que o resultado de um processo. Neste caso, da sucessão de derrotas e de frustrações que os sportinguistas se têm deparado nos últimos anos. Tal como as crianças pequenas que quando são continuamente frustradas se tornam agressivas, o mesmo acontece com os adeptos do Sporting. Após tantos anos de derrotas, de frustrações, de futebol miserável, é natural que o nível de tolerância tenha baixado significativamente e à mínima situação haja protesto. Temos que perceber que o assobio é das poucas formas de contestação encontradas pelos sócios/adeptos para demonstrar visivelmente os seus sentimentos de frustração. Poder-se-á criticar o alvo dos assobios, no entanto parece-me evidente que este tipo de emoções não são controladas pela razão. Aquilo que é necessário é escoar agressividade, seja o alvo quem for. Nos últimos tempos tem sido o Rui Patrício ou o Djaló, mas se eles não estivessem lá seriam encontrados rapidamente jogadores substitutos para que os adeptos possam expressar o seu desconforto em relação ao futebol praticado. No fundo, quando se assobia o Patrício está-se a assobiar todo o futebol apresentado nos últimos anos e não apenas o jogador.
Com isto tudo chegamos à parte final. Qual será a forma de resolver este problema? É evidente que se a frustração contínua gera ainda mais frustração e, consequentemente, comportamentos agressivos, é necessário encontrar medidas para que os adeptos se sintam menos frustrados. E quais são essas medidas? Parece-me óbvio: o Sporting precisa de começar a vencer, a praticar bom futebol, os jogadores precisam de marcar golos e os adeptos têm que sair do Estádio satisfeitos. Faço novamente um paralelismo com a infância: quando uma criança tem recorrentemente comportamentos agressivos relacionados com a frustração, é preciso frustrar menos a criança, dar-lhe afecto e, sobretudo, reforços positivos quando ela se comporta de forma adequada. Portanto, mais do que as críticas do presidente, de treinadores ou jogadores, como as célebres “fiquem em casa” ou “vão ao cinema”, é preciso começar a praticar bom futebol, reforçando positivamente os adeptos por irem ao estádio. De outra forma, este problema terá sempre uma tendência a crescer até atingir proporções destrutivas, tanto para os jogadores como para os próprios adeptos. Por outro lado, no dia em que se deixar de assobiar exibições medíocres o Sporting morre, porque significa que os adeptos deixaram de acreditar que o bom futebol e as vitórias são uma possibilidade e um objectivo.
Em suma, a mensagem que eu quero deixar com este pequeno texto é simples: comecem a jogar futebol e os assobios irão desvanecer totalmente. Não existe outra solução possível.
© Winston Smith 2010