A Escola de Lagos
“Embora não possamos localizá-lo em Sagres, parece-me óbvio que o sucesso dos Descobrimentos henriquinos passou pela existência de um centro dinamizador de conhecimento, onde as informações recolhidas no mar podiam ser analisadas por homens de conhecimentos e experiências variadas, e onde se encontravam as respostas técnicas, e mesmo científicas, indispensáveis para o prosseguimento das navegações em segurança. Não estou a falar, evidentemente, de um edifício destinado à lecionação, mas tão-só de um espaço de convívio e de cruzamento de experiências e de saberes, que criou uma escola, entendida neste caso como um estilo próprio de navegação oceânica… O local onde teve lugar esse convívio tem uma localização óbvia e, em meu entender, indiscutível - A vila de LAGOS, o centro nevrálgico das navegações henriquinas. A par da construção naval e da navegação astronómica, também a cartografia se desenvolveu sob a égide do infante.”. (A “escola” de Lagos, em “Henrique o Infante” de João Paulo Oliveira e Costa, 2009)
Um dia destes estava a falar com uma professora de história e falei-lhe naquela teoria, que já apresentei neste mesmo espaço, que a imagem que temos do infante pode não ser a real e que o homem do chapelão seria na verdade o rei D. Duarte. Ao qual ela me responde:
“-isso não sei… o que sei é que ele era um grande paneleirão”
Desatei-me a rir…
Então, segundo esta professora (que ouviu isto numa palestra), o Infante D. Henrique foi para Sagres porque foi convidado a afastar-se da corte pois a sua homossexualidade (não percebi se muito ou pouco evidente ou conhecida), ou simplesmente boatos sobre essa possibilidade, estariam a causar algum embaraço à casa real. Assim, ainda segundo esta teoria, o infante estabeleceu-se num local isolado (Sagres) para poder desfrutar da sua vida intima… Parece até, que há um relato do funeral de um pajem, com quem manteria uma relação amorosa, em que o infante se emociona em demasia e lhe dizem para ele se recompor.
O que é que isto interessa?.. Nada… Mas achei curioso porque não fazia a mínima ideia que existia esta teoria… Lembrei-me disto porque essa professora também defendeu que a “escola de Sagres” era na verdade em Lagos (não como uma escola como a definimos hoje mas como ponto de confluência de saberes e experiências) e que a propriedade que o Infante tinha em Sagres teria outras serventias mais “lúdicas”.
O infante D.Henrique (1394-1460), “o Navegador” e herói dos Descobrimentos, passou à história como um príncipe casto, já que nunca se casou e nunca teve qualquer ligação com mulheres. Segundo o historiador Fernando Bruquetas de Castro, a homossexualidade do infante ficou claro quando ele perdeu um amigo na campanha em Ceuta, em 1414. D. Henrique fez um luto de três meses e chorou muito. Tanto que seu pai, o rei D. João I, chegou a pedir-lhe que se contivesse. O comportamento incomum levou até seu irmão, o futuro rei D. Duarte, a dizer-lhe para que “não desse mais prazer aos homens para além do que se deve fazer de forma virtuosa”. Em Sagres, D. Henrique estava sempre rodeado de navegadores jovens que lhe traziam como prenda escravos negros. O mais estranho, contudo, é o desaparecimento do seu cronista, seu contemporâneo, que escreveu a sua história. “Por que desapareceu? Porque estava lá tudo e não queriam que a Igreja soubesse”, afirma Brusqueta de Castro.
fds… aí esta mais uma evidencia em como os experts nao passam da versao mais bem paga e woke da alcoviteira da tasca. “sabias que x facto historico?” “nao, mas sei que essa pessoa super importante na historia do país era ganda gay obla, todos os dias mamava um gajo diferente! porque é que achas que ele quis ir na direção de africa?”
Quê?!.. O famoso Grão Mestre da Ordem de Cristo? “Um grande paneleirão”, como disse a professora?
Naaaa…
:)))))
Ainda a propósito da plausível homossexualidade do Infante D. Henrique recomendo a leitura deste interessantíssimo artigo académico de um historiador da Universidade da Virgínia:
admin,+11.pdf (4.0 MB)
No último parágrafo desvalorizo a importância histórica deste facto… Partilhei uma curiosidade que até há meia dúzia de meses não me passava pena cabeça… A pessoa com quem estava a falar até foi mais longe, dizendo que, aos dias de hoje seria considerado um pedófilo (e daí saltou para o paulo pedroso)…
No entanto, talvez não devêssemos desconsiderar este facto… Não por o infante ter este ou aquele comportamento que, no seu tempo ou no nosso, possa ser criticável, mas sim por ser demonstração da manipulação histórica ao serviço de uma narrativa gloriosa que se quer impor. Neste caso, a tentativa de criar um herói nacional, um exemplo, um homem sem falhas… Ora, não retirando a importância histórica do infante, que sem dúvida a tem, talvez fosse igualmente importante desconstruir certos mitos, trazer esses heróis para a sua condição humana, com as suas falhas e os seus defeitos. Mas mais ainda, o conhecimento sobre a sua vida pessoal, a sua personalidade, até a sua sexualidade, pode ajudar a explicar comportamentos ou decisões políticas que tiveram influência na história do país.
desvalorizas porque é irrelevante
Aquando das Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, foi publicada a obra, que tenho:
O doc. 35 apresenta a documentação histórica relativa a “virgindade/castidade de D. Henrique” (pag 151 a 156) em que nada aponta para homossexualidade embora haja quem defenda a virgindade a outros apenas um comportamento casto, havendo um documento alegadamente visto no Vaticano que pode levar à possibilidade de ter tido uma filha natural.
Também tenho a recente obra:
“durante os seus 66 anos de vida não deixou memória de relacionamento afectivo com qualquer outra pessoa. Seus contemporâneos criam que ele morreu virgem. Talvez…, é bem possível que sim, e as insinuações em contrário não têm nenhum fundamento documental.”.
Talvez não seja assim tão irrelevante… poderia se-lo se:
1- a História fosse apenas um elencar de acontecimentos de forma crua e sem impacto na actualidade
2- houver uma dissociação entre a personalidade de alguém e as suas acções e decisões
3- não houver apropriação dessas figuras por um determinado sector da sociedade
Só que nenhuma das 3 se verifica… em primeiro lugar a História não se limita a elencar acontecimentos. Procura compreende-los, saber que processos suportam esses acontecimentos; para além disso, dela resultam modelos de comportamento que servem de referência para as gerações seguintes… e, nesse sentido, os diferentes regimes sempre se apropriaram da História com propósitos propagandísticos, procurando a criação de mitos e herois que servissem de modelo. Nesse caminho de glorificação muitas vezes apenas nos chegam meias verdades.
Depois, é importante perceber se esses modelos virtuosos podem ser dissociados de outras características menos exemplares e se, na definição desses modelos, faz sentido apresentar a pessoa real ou apenas aquilo que importa realçar, procurando dessa forma uma espécie de visão maniqueísta sobre cada uma das figuras históricas… Ao escolhermos algumas características e desprezarmos outras construímos no nosso imaginário a imagem dessas figuras… Neste caso, por exemplo, esta informação mudou a imagem que tinha do infante (que não tomo como certa mas que encaro como uma possibilidade)… Seguindo esta tese posso imaginar o infante com uma personalidade que poderia equiparar à do josé socrates, algo que nunca me tinha passado pena cabeça… Alguém com visão, que procura a inovação, megalómano, ambicioso, com sede de riqueza, de poder, arrogante e narcisista… e homossexual (pelo menos, correram boatos disso). Ou seja, em termos de modelo simplificado é uma informação que pode ter alguma influência.
Por fim, podemos ainda ver do ponto de vista da apropriação ideológica… A imagem que foi construída do infante é de alguém casto, que dedicou a vida a um propósito nacional, sendo tomado como exemplo por sectores mais conservadores e nacionalistas quando na verdade pode ter sido um globalista, homossexual e pedofilo (a tal elite que, segundo algumas teorias da conspiração divulgadas por certas correntes conservadoras e nacionalistas, domina o mundo)
E afecta os simbolos… O topónimo Sagres, por exemplo, está associado à ideia de grandiosidade, de glória, que deriva da ideia de que nesse lugar estava sediada uma grande escola de navegação que abriu novos mundos ao mundo quando na verdade era local de aventuras libidinosas de cariz homossexual e pedofilo por parte de d. henrique… Por coincidência, ou não, a marca de cerveja que patrocina os rabolhos é a sagres…
Afinal de contas pode não ser assim tão irrelevante…
Ok leva lá a taça, o infante d Henrique apartir de agora é terá o cognome de “o paneleiro”
Sagres:
Embora já tivesse uns paços em Lagos, o primeiro senhorio do Infante D. Henrique na região foi no cabo de São Vicente e área envolvente num raio de uma légua, incluindo assim a área onde está a fortaleza de Sagres. A documentação coeva mostra que até 1443 não havia nenhuma edificação. Só em 1446, o Infante assinou um documento “estando em a minha vila” quiçá ainda em construção (na atual fortaleza), que ele mandou erguer para residência e onde viria a falecer em 1460… Ou seja, só foi viver para a casa de Sagres com cerca de 52 anos (no mínimo), bastante idade para a época. (vd. “Henrique o Infante”)
Falso. Ele só foi para Sagres porque tinha as melhores festas LGBT da península Ibérica
Um texto que diz praticamente tudo sobre a importância do controlo da produção historiográfica e da razão da narrativa histórica ser uma batalha permanente… Os mortos estão à mercê dos vivos (o infante D. Henrique foi a figura histórica mais destacada pelo Estado Novo…, agora está a pagar por isso mesmo).
Quem controla o passado, controla o futuro. Quem controla o presente, controla o passado.
Tal como, provavelmente, “ganhou” com isso durante o estado novo. Sendo que, na verdade, o infante d. henrique até nem tem grandes razões para se queixar. Continua a ser visto como uma das maiores figuras da História de Portugal (e com razão… exagerada ou não é outra discussão), talvez só comparada, em grandeza, a d. afonso henriques e com uma aura de herói nacional inabalável.
E eu não defendo que o infante era isto ou aquilo… Simplesmente criei, no meu imaginário, um outro infante d. henrique que convive com o anterior no plano das possibilidades… Agora, quando ouço falar ou leio algo sobre o infante d. henrique, procuro arrumar essa informação nas duas imagens que tenho dele. Sabendo que, certamente, nem foi o herói “puro” do estado novo nem esta nova figura que me chegou há poucos meses… ou ter sido as duas em simultâneo. Simplesmente, enriqueceu o meu conceito “infante d. henrique” com novas possibilidades.
(acontece o mesmo com a própria imagem do infante… Pode ser o homem do chapeirao ou o cavaleiro roxo dos painéis de s. vicente… Convivem os dois, pacificamente, no meu imaginário)
Tanto tempo no mar, sem xvideos, so’ homens e as maos cheias de calos das cordas.
Nao admira que alguns se atirassem com o cantico das sereias.
O que critico é a abordagem ao Infante D. Henrique baseada na sua pretensa sexualidade, em vez da sua ação histórica (por assim dizer), pois isso deixa a ideia de que se pretende apenas rebaixar (e dito por uma professora de História)… Quando se fala dos “heróis” atuais como Mário Soares e outros do regime, é a sexualidade que se analisa?
Onde está a crítica historicamente justa à pouca qualidade militar como general do Infante patenteada no ataque impulsivo em Ceuta e no cerco sofrido em Tânger? Ou a apectos éticos do abandono do irmão D. Fernando como refém em Tânger em vez de ficar ele próprio?.. Dá “mais dividendos” a pretensa pedofilia e nessa linha?
Admiro mais do que o Infante grandes generais com Nuno Álvares Pereira e Afonso de Albuquerque (administrador, diplomata, navegador, almirante…), mas quando se fala do Infante D. Henrique temos o mentor da gesta única dos Descobrimentos…, o resto é de interesse menor, pois menor foi o seu impacto histórico…, eu pelo menos vejo assim.
Repara que a forma como o raciocínio é construído – bem construído e de forma lógica, até – vai no sentido de automaticamente segmentar e colocar num perfil tido como conservador e nacionalista a impossibilidade de realizar a tão propalada “globalização”, como se fosse um fenómeno recente, ao mesmo tempo que, implicita e miticamente, atribui ao Estado-novo a impossibilidade ou incapacidade de realizar trocas comerciais com o exterior. Mesmo sendo o Estado-novo, e a participação portuguesa no processo de integração é bem conhecida na historiografia, o responsável pela adesão de Portugal à EFTA. E cujas preocupações públicas para fomentar as exportações começaram desde o final dos anos 40.
Hoje, quando olhamos para a balança comercial dos produtos que mais contribuem para a longevidade dos cidadãos, pelos níveis de iodo que nos possibilitam obter, somos brindados com isto:
Pelo meio, equiparam-se os feitos do Navegador aos do Zé…
Porreiro, pá!
Mas a conversa dessa professora nem se centrou no infante d. henrique… atirou aquilo como forma de “piada” ou para chocar (foi numa conversa informal… num convívio) e depois acrescentou uma ou outra coisa sobre isso. Ela pegou naquilo para levar a conversa para uma “teoria da conspiração” sobre a classe política e judicial da actualidade. Perante toda a conversa que se seguiu fiquei com a ideia que havia ali muita fantasia à mistura (ou, pelo menos, hipóteses pouco verosimeis)… não dei grande importância à conversa mas, a surpresa que me causou a afirmação que transcrevi, levaram-me a pesquisar se, realmente, havia alguém que tivesse explorado essa tese… e a verdade, é que há… não estudei o assunto, nem fui verificar em que se baseia. Simplesmente verifiquei que havia quem a defendesse e que não era, somente, fruto da imaginação dessa professora.
A importância deste facto deve-se simplesmente à construção de um perfil psicológico da “personagem”. E desse perfil psicológico dependem as motivações e emoções que conduzem a determinadas acções e decisões. Não se trata de fazer um revisionismo maniqueísta… na prática, a importância histórica da figura mantém-se, simplesmente abro a porta à possibilidade de os pressupostos que levaram a essas acções e decisões serem diferentes daqueles que anteriormente tomava como certos. Porque uma coisa é estarmos a falar de alguém completamente despojado da sua sexualidade, que não pensa nisso ou, pelo contrário, se martiriza com isso, mas que se apresenta, com orgulho, como aquilo que é e outra é de alguém que aparenta castidade mas que na verdade é (também) movida por impulsos sexuais, mal vistos pelos seus contemporâneos, que concretiza em segredo. E à luz de cada um desses perfis nós podemos entender cada acção ou decisão de forma diferente. No fundo, ajuda-nos a compreender um acontecimento como sendo o resultado de uma circunstância e das decisões tomadas pelos seus intervenientes… e para isso temos de os conhecer.
A Romenia do Ceaușescu tambem tinha uma balanca comercial saudavel.
Nao fosse ele vender tudo o que se produzia ate’ os alimentos e deixar a populacao na miseria.