A História

Havendo por aqui tanta conversa, noutros tópicos, em que a História está subjacente ou mesmo explícita, talvez fosse adequado abrir um tópico específico para curtas trocas de ideias…

Talvez começar com a Independência de Portugal. Há pouco tempo coloquei esta sequência na Net.

Em 1071, o antigo Condado Portucalense é extinto.

Em 1095/6, criação do novo Condado Portucalense pelo Rei D. Afonso VI de Leão e sua entrega em doação hereditária ao genro, o Conde D. Henrique de Borgonha, e a sua filha D. Teresa.

A 24 de Junho de 1128, batalha de São Mamede, os Portugueses libertam-se do poder da nobreza da Galiza que controla D. Teresa, e D. Afonso Henriques ascende a Conde depondo a sua mãe.

A 25 de Julho de 1139, batalha de Ourique, D. Afonso Henriques aclamado Rei dos Portugueses assume esse título sem requerer permissão ao Imperador D. Afonso VII, o que manifesta os seus propósitos independentistas.

A 4/5 de Outubro de 1143, conferência de Zamora, o Imperador da Hispânia, D. Afonso VII, reconhece o título de Rei a D. Afonso Henriques, conquanto este se mantenha seu vassalo.

A 13 de Dezembro de 1143, D. Afonso Henriques envia a carta Clavis regni ao Papa Inocêncio II propondo-lhe a vassalagem direta de Portugal à Santa Sé, o que significa deixar de ser vassalo de D. Afonso VII.

A 1 de Maio de 1144, o Papa Lúcio II envia a resposta pela carta Devotionem tuam designando D. Afonso Henriques como Duque Portucalense e aceitando a sua vassalagem direta à Santa Sé, pelo que este e Portugal ficam libertos da suserania do Imperador da Hispânia D. Afonso VII de Leão e Castela.

A 23 de Maio de 1179, o Papa Alexandre III emite a bula Manifestis probatum reconhecendo D. Afonso Henriques como Rei dos Portugueses e reafirmando a respetiva vassalagem à Santa Sé.

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Muito interessante, muitos detalhes que desconhecia!
A historia da Europa na idade media, é dos temas que mais me interessa.

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:great:

( Manda-lhe um forte abraço. :great: )


Faz hoje 634 anos que ocorreu a batalha de Aljubarrota e que permitiu estabilizar Portugal da sua guerra civil, depois da morte do Rei Fernando I de Portugal.

Como não existia um herdeiro masculino da coroa e a sua filha, D. Beatriz de Portugal, era casada com um gajo que tinha interesse em anexar Portugal ao seu reino, o de Castela, o povo com medo de perder a sua independência, aclamou para que o seu irmão bastardo fosse nomeado Rei de Portugal. Assim, o Mestre da ordem de Avis, D. João I de Portugal foi aclamado Rei pelas cortes de Coimbra.

O Rei D. João I de Portugal e o seu grande amigo, D. Nuno Álvares Pereira, um cavaleiro brilhante, com a ajuda dos bifes, encheram a bilha aos Castelhanos, patrocinados pelos franceses. :lol:


Batalha de Aljubarrota.jpg

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O jurista João das Regras desenvolve a brilhante argumentação jurídica que justifica a eleição de D.João I nas cortes de Coimbra de 1385… Parece que a espada de Nuno Álvares também terá ajudado a decisão de alguns indecisos… Não tanto por serem pró-Castela, mas por hesitarem quanto aos eventuais direitos ao trono dos filhos de D. Pedro e Inês de Castro…

FBA - Fundação Batalha de Aljubarrota… A não perder, está espetacular.

Se tiveres tempo importas-te de desenvolver um pouco, ou partilhar um link onde se possa ler sobre isso?
Adoro este topico btw, excelente :great:

O próprio irmão do Nuno Alvares Pereira que salvo erro morreu na batalha e muita nobreza da época alinhou do lado castelhano.

O facto do mestre de Avis ser filho bastardo não deve ser alheio a muitos desses se terem passado para o lado castelhano.

A importância da estratégia de Nuno Alvares Pereira , a forte coesão da sua ala dos namorados , a importância dos arqueiros ingleses à semelhança das batalhas da Guerra dos 100 anos , de Crecy e Poitiers , ganhou o dia , contra a força bruta da carga castelhana e principalmente francesa.

A maior parte da nobreza castelhana foi dizimada no campo de batalha , enquanto a de cá perdeu influência e poder como grupo.

A revolução de 1383-5 , a primeira revolução verdadeiramente popular em Portugal e certamente das primeiras do mundo.

O Mestre de Avis e a sua aliança com as camadas populares derrotou uma visão territorial clássica fragmentada e obscurantista da Alta Idade Media em favor duma perspectiva nacional e
de concentração do poder do rei em detrimento do poder da Alta Nobreza.

Não é por acaso que a seguir se deu os Descobrimentos , esta revolução libertou energias presas da nação , enquanto , os outros países europeus contemporâneos ainda estavam presos em fortes contradições de dominio territorial.

Esta dinastia de Avis lançou as bases definitivas para a independencia de Portugal , nem os Filipes no sec. XVI conseguiram dar a volta a isso , o trabalho já estava feito , a chama da nação já tinha estado activa por demasiado tempo para qualquer um querer apagá-la.

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Se tiveres tempo importas-te de desenvolver um pouco…

[/quote]

É que nas Cortes de Coimbra de 1385, João das Regras teve de argumentar no sentido de convencer a assembleia de que não havia direito ao trono por parte de ninguém, estava vago, e portanto haveria necessidade de eleger um novo rei, uma nova dinastia, escolhido livremente. Para isso, era preciso não só elevar os méritos do Mestre de Avis, futuro D. João I, no sentido deste ser o eleito, mas também, necessariamente, demonstrar que os pretendentes que alegavam direito dinástico ao trono não o tinham.

E quem eram estes?

Em primeiro, D. Juan de Castela e sua mulher D. Beatriz. D. Juan perdera qualquer eventual direito porque invadira Portugal pelas armas e sempre obedecera ao antipapa de Avinhão contra os preceitos da verdadeira Igreja (representada pelo Papa de Roma) e D. Beatriz também estava sem legitimidade porque era de origem duvidosa e sua mãe já era casada quando D. Fernando a impôs como Rainha e o Papa nunca anulou o primeiro casamento nem reconheceu o segundo, pelo que D. Beatriz era efetivamente bastarda.

Em segundo, era preciso desmontar os eventuais direitos dos dois filhos do Rei D. Pedro e de Inês de Castro, que eram D. João e D. Dinis, e João das Regras alegou que a sua bastardia também era manifesta, porquanto o casamento dos pais fora secreto sem provas documentais, enquanto havia documentação segundo a qual a Igreja não aceitara os pedidos de D. Pedro para realizar esse casamento, além de que D. João e D. Dinis tinham apoiado a invasão de D. Juan de Castela (estavam exilados em Castela desde desavenças com D. Fernando e D. Leonor Teles).

Destruindo as pretensões dos outros candidatos, ficava aberta a porta para outro filho bastardo de D. Pedro (mas não com Inês de Castro) se candidatar ao trono e ser eleito nas cortes, D. João I. A questão era importante, pois parte dos principais nobres anti-Castela aceitava a legitimidade dos filhos de Inês de Castro. Note-se que, depois da morte do irmão, D. Dinis é aclamado Rei de Portugal pelos seus partidários e, em 1397, invade Portugal pela Beira acabando derrotado e morre logo em 1398.

Ontem ou anteontem estava a dar na RTP memória , a história do Alandroal na crise de 1383-5.

Mas parece que a parte que eu achei curiosa , não aparece neste excerto , a história da cilada do Alandroal.

Vasco Porcalho , alcaide de Vila Viçosa trai o mestre de Avis e entrega a vila aos castelhanos , como recebe má vizinhança do Alandroal , manda tomar a vila e dá-se esta história curiosa :

104. COMO VASCO PORCALHO FOI CORRER AO ALANDROAL, E DA PRESA QUE TOMOU AOS PORTUGUESES.

O Comendador Vasco Porcalho, vendo a fouteza que contra ele mostrava Pero Rodrigues com os que consigo tinha, escreveu a Pero Rodrigues da Fonseca, Alcaide de Olivença, para que mandasse correr a vila do Alandroal de que recebia muito má vizinhança, e que ficasse certo de que, quando os corressem, logo sairiam a eles tanto os de pé como os de cavalo da vila, e que os não haviam de largar até ao rio de Odiana, que a tanto corriam os homens de pé daquele lugar como os de cavalo, e que assim os podiam prender e acutilar à sua vontade lançando-lhes uma cilada bem longe para cá do lugar (a leste). E enquanto ele mandava este recado enviou vinte de cavalo a correr o Alandroal, e fizeram presa nuns poucos de asnos e isto foi-lhes tolhido pelos do concelho. Estes corredores, tornando para a vila, disseram a Vasco Porcalho que não entendiam de lá mais ir daquela guisa, porquanto os seguiram de tal maneira que se o caminho não fora longe lá teriam ficado por seus hóspedes.

O Comendador, com grande despeito, cavalgou era grande madrugada e levou cento e cinquenta de cavalo e duzentos e cinquenta homens de pé, e lançou-se em cilada cerca do Alandroal, onde chamam o Pinheiro, e depois que foi bem de dia mandou vinte de cavalo que corressem até às portas da vila, e que a qualquer coisa que achassem travassem (deitassem mão) nela sem receio nenhum, e os ginetes fizeram como ele lhes mandou e correram até às portas do lugar e tomaram setecentas cabras. Os da vila saíram a eles, Pero Rodrigues com dez de cavalo, e setenta e cinco homens a pé, e foram os de cavalo por outra parte para lhes tomar a dianteira, e já os de pé tinham as cabras tiradas aos corredores e os de cavalo foram dar com a cilada, a qual sendo descoberta deixaram-se todos ir direitamente à vila, que era muito perto.

Pero Rodrigues quis acorrer aos peões, e vieram todos em confusão até cerca das casas do arrabalde da Mata e ali os esperaram e começaram de pelejar, e Pero Rodrigues era a pé com os seus. E sendo a peleja muito desigual foram os portugueses por força vencidos e fugiram para a vila, acolhendo-se às casas da rua da Mata que eram furadas umas pelas outras, e por ali foram escapando, que doutra guisa os mais deles teriam sido mortos e presos, mas não houve mais que cinco homens mortos, bem mancebos e para muito, os quais lhos mataram junto ao muro, e foram muitos feridos, e Pero Rodrigues houve uma ferida, e dos castelhanos morreram dois, e quinze cavalos.

Tornou-se então Vasco Porcalho com grande prazer para Vila Viçosa, e levou aquelas setecentas cabras sem haver ninguém que lhe pusesse embargo, e ficou Pero Rodrigues com os seus bem nojoso por tal desaventura, e por isso dizia de praça para os confortar: Amigos, tal vai da guerra em semelhantes coisas. Oitenta e cinco a trezentos e cinquenta deixar-lhes o campo sem vergonha o podem fazer, e estes que morreram por defensão do reino, Deus lhes haverá mercê às almas.

https://www.azpmedia.com/espacohistoria/index.php/cronica-de-d-joao-i/capitulo-xi

Ou seja lá conseguiram escapar e chegar ao castelo do Alandroal , porque as casas do arrabalde da Mata estavam todas ligadas umas com as outras.

Morreram dois irmãos de D. Nuno que estavam por D. Juan, mas pelo menos mais um (Rodrigo) que era por D. João I mas não participou nessa batalha pro ter sido feito prisioneiro num confronto anterior…

Por mim, não alinho muito na interpretação da “revolução popular”, embora o povo tenha agido na rua em conformidade… É verdade que a antiga nobreza sofreu grande dano, mas não foi o povo que lhe sucedeu no poder, mas sim uma enorme concentração de poder na Casa Real e nos descendentes de D. Nuno… Repara que antes da “revolução” julgo que apenas haveria um Conde que era o Andeiro (de cor não vejo outro), nada de altos títulos aristocráticos… Estes aparecem em força precisamente na sequência da “revolução”, Duques, Marqueses, Condes… Toda uma alta aristocracia controla o país territorialmente e as ordens militares…, só que é de sangue real…, poder do povo, mesmo que fosse da burguesia, népia…

E não é a burguesia que faz os Descobrimentos, é um empreendimento do Estado, da Casa Real, e das ordens militares dominadas por infantes reais… São os seus escudeiros e cavaleiros que dirigem as naus e são altos nobres que comandam as armadas…, não são mercadores burgueses e suas organizações como aconteceu com os holandeses… Onde estão os bancos, a bolsa, os financeiros burgueses portugueses? Népia

Há muito de “marxismo cultural” na interpretação “oficial” da nossa história, não porque coincida com o que ocorreu, mas porque é necessário utilizar o respetivo método de análise… Como a treta das supostas razões económicas para a tomada de Ceuta (só se foi para esvaziar os cofres do Estado na manutenção da praça).

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Yep, thanks man, conforme ia lendo o teu texto comecei a relembrar a minha professora de Portugues a contar-nos isso tudo no 11 ano… ja la vao 33 anos :smiley:
Ja a invasao de D.Dinis, nao tinha mesmo conhecimento :great:

Quando se fala em rev. popular , é claro , que não estamos a falar de uma revolução moderna , afinal , estamos a falar de uma época que tinha a divisão dos 3 estados.

Rev. popular no sentido , em que o partido que o povo toma é o que sai vitorioso e o partido que sai derrotado é o partido da alta nobreza que estava praticamente todo do lado castelhano.

Os estados praticamente todos saiem enfraquecidos da alta idade media , a nobreza tem muito poder , o poder e o território estão fragmentados e o poder dos reis está muito enfraquecido.

É neste contexto que a aliança das camadas populares com o mestre de Avis que sai vitoriosa vai no caminho da concentração do poder do rei , dum estado mais forte , que depois leva ao empreendimento dos Descobrimentos.

É a aliança entre a burguesia e a pequena nobreza que leva a estes sucessos e ambos são peças fundamentais nos descobrimentos , ainda que não no estilo capitalista e privado holandês , mas num nível que ainda hoje se vê em Portugal , com o Estado a comandar , a financiar o barco.

Em 1469 foi arrendado a Fernão Gomes o comercio da Guiné.

https://pt.wikipedia.org/wiki/Fernão_Gomes_da_Mina

É obvio o papel importante da burguesia /comercio e fidalgos / cargos militares e depois administração do império.

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Hermano Saraiva ficaria radiante com a informacao aqui partilhada.
Da independencia 'a sua manutencao, perca e reconquista, ha episodios de estrategia geniais e outros tantos erros primitivos.

Quando acabei e publiquei o meu texto tive logo a sensação que irias responder evocando o caso do Fernão Gomes… :angel:… É verdade, mas corresponde a um tempo de enfraquecimento do projeto de Estado dos Descobrimentos, porquanto o Rei D.Afonso V optou por concentrar-se na guerra em Marrocos e em Espanha… Era um rei à antiga, à medieval que só atrasou o avanço português pelos mares…

Julgo que a figura central nos Descobrimentos em termos comerciais não foi o burguês dedicado aos negócios mas sim o chamado fidalgo-mercador… ou seja escudeiros, cavaleiros, gente que se considerava da pequena nobreza, que com a expansão entrou decididamente no comércio ultramarino (os que pertenciam às ordens de Cristo, Santiago, Avis eram obrigatoriamente nobres)… A fraqueza da burguesia foi sempre uma peja no desenvolvimento nacional… Mas isto não obsta ao que disseste…

Mas há um preconceito, repara por exemplo como os famosos biombos Namban japoneses com portugueses no Japão mostrando, em grande parte, atividade dirigida ao comércio são muitas vezes referidos como apresentando mercadores portugueses… Eu por mim, fico na minha, são mas é nobres (vê só a as espadas e o magnífico trabalho do punho) que vão ao comércio… os fidalgos mercadores… Esses gajos eram burgueses? Não posso crer… Eram de famílias de escudeiros e de cavaleiros e consideravam-se, e eram considerados, da fidalguia não aristocrática.


Era um espetáculo na forma como comunicava, apenas acho que exagerava na forma como criava sempre “outras formas de ver” mais focadas em passar uma nova interpretação do que em passar a interpretação mais razoável… Também acho que a sua visão da História foi muito influenciada pelo irmão António José Saraiva, que idolatrava, e que então era simpatizante do Materialismo Histórico, o que se nota no dualismo simplista sempre presente no Hermano (pequenos vs grandes, etc…)

Na 4f estava a dar um documentário na rtp3 sobre o pós Aljubarrota.

O que achei interessante perceber foi que o Nuno Alvares Pereira não optou por alinhar pelo lado do D. João I por qualquer tipo de nacionalismos, nem nada que se pareça, mas por interesses pessoais. Os nobres na altura defendiam quem lhes poderia ser mais conveniente para aumentarem o seu poder e influência dentro do reino. Daí não achar estranho que muitos nobres portugueses tenham-se aliado ao rei de Castela, que lhes deveria ter prometido as mesmas influências.
Simplesmente não havia um conceito de estado-nação como passou a existir após 1640 ( mesmo aí parece-me que ainda era um proto estado nação )

O Nuno Alvares Pereira por altura de 1385 era um dos homens mais ricos do país, tão rico como o próprio rei. Detinha um dos principais exércitos privados do reino e era o maior dono de terrenos do país. Ao apoiar o Dom João I, o seu objetivo era aumentar ainda mais essa sua posição.

Após a batalha, o Nuno Alvares Pereira e o Dom João continuaram a lutar contra Castela na tentativa de cimentar a sua posição dentro do reino e a legitimar o seu reinado. O engraçado é que aí o Dom João I e o Nuno Alvares Pereira discordam sobre a forma como deveriam cimentar essa posição e sobre a forma como o Reino deveria ser administrado daí para a frente. Dom João I, tal como prometido oferece mais terras e dominios a Nuno Alvares Pereira que se tornou dono de quase metade do país.

Na sequência disto Nuno Alvares Pereira começou a distribuir terras e dominios pelos seus veteranos da guerra da “independência” de 1385, situação que faria aumentar ainda mais a influência do mesmo no Reino, pois passaria a controlar ainda mais vassalos. Dom João I, ordenou a Nuno Alvares Pereira que acabasse com isto e os dois entraram em conflito. Foi aí que Nuno Alvares Pereira ameaçou apoiar o Rei de Castela nas suas pretensões para Portugal.

Dom João I, sabia que perder o apoio do homem mais rico e poderoso do reino significaria perder o reino, daí que após várias tentativas chegou a um acordo de casamento entre um dos seus filhos bastardos e a única herdeira de Nuno Alvares Pereira. A decisão de Nuno Alvares Pereira de casar a sua filha com um bastardo deve-se ao facto de dessa forma o nome e o poder da familia continuariam a ser da familia de Nuno Alvares Pereira e não passaria para a familia real.

Basicamente desta união surge a casa de Bragança, que continua a ser a familia mais poderosa do reino e que 250 anos depois, chega mesmo ao trono do país e à sua liderança oficial.

Bem não vi o documentário…, mas as crónicas são claras em que, desde muito jovem, Nuno Álvares Pereira sempre recusou que Portugal tivesse Rei não natural, ou seja não português.

Quanto ao segundo episódio, Nuno Álvares não ameaçou apoiar o Rei de Castela… O que está na Crónica de D.João I é que juntou os seus vassalos e partidários dizendo:

como el-rei havia por serviço seu de lhe tirar parte das terras que lhe dadas tinha, por a qual razão se ele não entendia suportar, como a sua honra pertencia, com as que de lhe ficar houvessem; e que por isso se queria ir fora do reino a buscar sua vida, guardando sempre o serviço de el-rei, seu senhor; e rogava que fossem em isto seus companheiros; e que, se alguns deles tivessem dúvida de o não poderem fazer, que assi o dissessem logo

D. João I acabou por se entender com D. Nuno e este não partiu… Defesa exclusiva de interesses pessoais sem qualquer patriotismo; abandono do reino para apoiar o rei castelhano… Não será que se “está a trabalhar” no sentido do “antinacionalismo”, revendo a historiografia nacional? Fico desconfiado…

O documentário foi este “D. Nuno Álvares Pereira e as Artes da Guerra, Museu Nacional” : D. Nuno Álvares Pereira e as Artes da Guerra, Museu Nacional... - Visita Guiada - Magazines - RTP

Dúvido que haja alguma agenda, aliás, na minha opinião pessoal, grande parte da história de Portugal e do mundo está muito adulterada e exagerada por forma a haver uma maior união da população através do nacionalismo. Provavelmente propaganda do estado novo e nunca houve um grande cuidado em atualizar e procurar outras fontes para descrever alguns episódios da história.

É este episódio da crise de 1383-1385.

Alguns dos que estão muito mal escritos na história portuguesa e da peninsula ibéria.
São a reconquista cristã… que inicialmente a religião tinha um papél completamente secundário, mas hoje em dia as pessoas acham que foi o fervor religioso a motivação, quando a religião só foi utilizada pelo D. Afonso Henriques por forma a obter dinheiro e tropas que estavam em trânsito nas cruzadas. São vários os senhores feudais, que tanto combatiam por reis ou taifas, tanto cristãos, como muçulmanos.

É o opisódio do Viriato, que aparentemente lutava pela sua “nação” contra o opressor romano, sendo traído pelos seus. Mas os lusitanos, como qualquer outra tribo ou estado, faziam o que podiam para ter poder. Os subornos a tribos e de tribos a legiões sempre foi prática comum, umas vezes as tribos procuravam protecção romana, outras vezes a iniciativa partia dos romanos. Não houve nada de romântico e assim tão diferente na luta dos lusitanos contra os romanos face ao que acontecia um pouco por todo o lado no mundo clássico.

E o que não faltam são episódios destes um pouco por todo o lado. Ainda outro sobre o rei Herodes, outro sobre o Nero e outro sobre o Dário da Persia que nos davam uma perspectiva bem diferente e bem fundamentada sobre estas personagens tão controversas da história. De como foram utilizados pela propaganda da altura para elevar outras personagens.

É super interessante perceber isto ao final destes anos todos, e que o mundo não mudou assim tanto do seculo 5 AC para a atualidade… xD

Acontece que a historiografia parece ser apenas a investigação neutral do passado no sentido da conservação da memória…, mas de facto é, e sempre foi, uma arma para as batalhas ideológicas e religiosas… Todos recorrem à história para se justificarem… O máximo que se deve pedir é que não se falsifiquem os factos documentados, que todos sejam expostos…, que as divergências, mesmo bem profundas, se situem somente no campo da interpretação dos factos apurados (da sua relevância relativa nos respetivos contextos), e da documentação sobrevivente ao tempo…

Acabei de ver o documentário que mandaste, apenas para logo me lembrar que já tinha visto, já nem sei há quanto tempo atrás… Concordo com o que o historiador diz, aliás já vi outros dele e tenho livros do tipo… Nota que ele reconhece que Fernão Lopes assegura que D. Nuno não pretendia mudar de partido… (na minha visão, o que o Condestável esperava mesmo era que D. João I o mandasse chamar de volta, julgo que foi “teatro” para desagravo da honra ofendida, mas isto é uma opinião pessoal claro…).

A Batalha de Ourique, a questão dos cinco reis mouros

Coloco aqui, à crítica leonina, uma interpretação que diria pessoal (tive-a após ler partes da Bíblia) sobre como terá, eventualmente, surgido a ideia de que D. Afonso Henriques venceu cinco reis mouros na batalha de Ourique, em 1139.

A batalha de Ourique foi travada aos 25 dias de Julho de 1139, dia de Santiago, no Alentejo, com as fases cruciais do confronto a ocorrerem na colina de São Pedro das Cabeças, entre as forças do nosso primeiro rei e um exército islâmico almorávida. Está diretamente associada à aclamação de Afonso Henriques como rei pela nobreza guerreira, logo antes do confronto ou logo depois, passando o infante a intitular-se Rei dos Portugueses, sem qualquer autorização de Afonso VII de Leão e Castela, Imperador da Hispânia.

À época, a povoação mais relevante nas proximidades era a de Ourique, mas hoje é a vila de Valverde situada 4 km a noroeste de São Pedro das Cabeças. A assinalar o local, temos um monumento de 1940 completado por outro de 1989, bem como uma pequena ermida mandada fazer pelo rei D. Sebastião, em 1573, no mesmo sítio onde existia uma outra, rústica e então em derrocada, mandada erigir pelo próprio D. Afonso Henriques logo depois da batalha.

A crónica Vida de São Teotónio (1082 a 1162), que foi canonizado pelo papa Alexandre III, em 1163, o primeiro santo português e primeiro prior de Santa Cruz de Coimbra, confessor de D. Afonso Henriques, escrita por um seu companheiro anónimo em 1163, precisa que o nosso primeiro rei venceu, a 25 de Julho, dia de Santiago, cinco reis pagãos acompanhados de grande multidão de mouros dos dois lados do estreito (de Gibraltar).

Pode ter sido escrita antes da Crónica dos Godos, a que se deu o título coletivo de «Annales Portucalenses Veteres» - Anais Portugueses Velhos, que serão de fins do século XII e princípios do século XIII, onde a batalha de Ourique é descrita com pormenores que levam autores modernos a duvidar dos mesmos. Aqui, fala-se da multidão de combatentes muçulmanos de Espanha e de Além-Mar (Magrebe), entre eles guerreiros das taifas (territórios independentes) de Sevilha, Badajoz, Elvas, Évora e Beja, e de outros castelos, incluindo amazonas que combatiam a pé ou a cavalo. Isto levou, posteriormente, a admitir que as cinco taifas corresponderiam aos cinco reis, embora seja evidente que só comportavam uma parte do total do exército mouro e a Crónica não use essa expressão. Importante, é que, embora de autor desconhecido, há hoje a convicção de que esta Crónica também foi produzida em Santa Cruz de Coimbra, tal como a Vida de São Teotónio.

Vamos agora expor resumidamente algumas passagens do Antigo Testamento da Bíblia que talvez sejam a explicação para a questão em epígrafe:

Adonisec, rei de Jerusalém, soube que Josué tinha tomado a cidade de Ai,… Soube ainda que os habitantes de Guibeon tinham feito a paz com os israelitas e viviam com eles… Uniram-se, pois, os cinco reis amorreus, isto é o rei de Jerusalém, o de Hebron, o de Jarmut, o de Láquis e o de Heglon e saíram com os seus exércitos para cercarem e atacarem Guibeon… Josué partiu de Guilgal, caminhou durante toda a noite e atacou de surpresa os reis amorreus…o Senhor fez desabar sobre eles uma tempestade de grandes pedras de granizo… E foram mais os que morreram por causa das pedras de granizo do que aqueles que os israelitas mataram à espada… O Senhor combatia por Israel… Josué e os israelitas derrotaram-nos e destruíram-nos…Mandou depois matar os cinco reis. [Josué 10].

…, porque são cinco os chefes dos filisteus, uma vez que o mesmo castigo vos atingiu a vocês e aos cinco chefes… das seguintes cidades: Asdod, Gaza, Ascalon, Gat e Ecron…, os filisteus avançaram para atacar o povo de Israel, mas o Senhor mandou contra eles fortes trovões. Os filisteus entraram em pânico e Israel derrotou-os. [Samuel 6 e 7].

Considerando que quem escreveu sobre a batalha de Ourique foram clérigos do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, poucas décadas depois do confronto, não será que se inspiraram no modelo bíblico dos cinco reis ou chefes inimigos do povo de Deus derrotados numa grande batalha para construirem a sua narrativa? Não será que os cinco reis pagãos de Ourique são decalcados dos cinco reis amorreus e dos cinco os chefes dos filisteus? Não será que as taifas de Sevilha, Badajoz, Elvas, Évora e Beja são referidas por inspiração nos amorreus de Jerusalém, de Hebron, de Jarmut, de Láquis e Heglon, e nos filisteus de Asdod, Gaza, Ascalon, Gat e Ecron?

Era, talvez, a forma ideal de realçar as importância da batalha de Ourique para D. Afonso Henriques e para os Portugueses… Uma vitória contra os muçulmanos idêntica às grandes vitórias bíblicas contra os infiéis. Daria, talvez no final do reinado, azo ao brasão real com os cinco escudetes (os cinco reis?) repletos de besantes (as grandes pedras de granizo com que Deus ajudou?).

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