Não é pelo facto do gajo ser lamp que não escreve coisas acertadas de vez em quando. O que ele escreve já eu pensava (apenas a falta de tempo e oportunidade me impediu de iniciar um tópico sobre as declarações de Dias da Cunha citadas) e muitos foristas têm dito. Aos outros, deixem-se de ilusões.
DIAS DA CUNHA tem um mérito inegável. É directo e fala claro. Daí que tenha particular significado o que disse no Núcleo Sportinguista da Parede. Respigo dos jornais: «Quando o peso dos bancos, que têm sido grandes parceiros, deixar de estar sobre o Sporting, é que o clube pertencerá por inteiro aos seus associados. E então sim, nas assembleias que servem para eleger os dirigentes, os associados poderão fazer o que bem entenderem.»
Dias da Cunha não poderia ter sido mais explícito. Neste momento, não há solução de alternativa ou de mudança que não seja caucionada pelos bancos que, de facto, foram tão fortes e decisivos parceiros que, neste momento, têm um poder evidente na política de gestão e na escolha das lideranças do Sporting.
O presidente do Sporting voltava a ser de uma transparência desarmante. Falava do que sabia e falava sem complexos e sem preocupações especiais em ser politicamente correcto.
Mas até por isso, Dias da Cunha poderia ter ido ainda mais longe, afirmando que esta não é, afinal, uma realidade específica do Sporting. Todos os principais clubes, onde naturalmente se incluem o Benfica e o FC Porto estão na mesma dependência, sendo legítimo dizer-se que, para já, os bancos com os quais foram negociados os diversos «projects finance », caucionam e apoiam as actuais lideranças dos grandes clubes portugueses, ou melhor, das respectivas SAD.
O que coloca precisamente a questão no ponto em que Dias da Cunha a deixou. Se, eventualmente, os sócios do Benfica, do FC Porto ou do Sporting quisessem, com ou sem razão, estruturados em argumentação válida ou não, optar por nova política e novos dirigentes, a escolha dificilmente seria levada à prática, sem o apoio e aprovação total dos bancos. Assim sendo, a pergunta torna-se óbvia: Serão, então, os bancos os novos donos dos clubes, em Portugal?
Nem que seja por excepção, nem tudo o que parece, é. No fundo, passa-se com os clubes o mesmo que se passa com uma parte muito significativa dos cidadãos portugueses, também eles mergulhados em pesadas dívidas aos bancos que zelosamente se disponibilizaram a fazer empréstimos globais para a compra de casa própria.
Ora acontece que Portugal é um país de proprietários falidos. Por irresponsabilidade de um poder político que deixou morrer, sabe-se lá se por óbvias vantagens da indústria de construção, as soluções de arrendamento que se encontram por toda a Europa civilizada, obrigando ao cumprimento dessa máxima tão portuguesa: «Quem quer casa, que a compre.»
Os clubes compraram os novos estádios, acrescentaram dívidas à dívida e encontraram, tal como o comum dos portugueses, no crédito bancário a solução miraculosa para tocarem o sonho. Porém, tal como acontece ao cidadão comum, que aperta o cinto e a quem sobra sempre mês no final do ordenado, também os clubes se viram na contingência de negociar volumosos empréstimos de acordo com critérios definidos com rigidez pelos bancos.
E também, tal como o cidadão endividado não pode dispor, na totalidade, de uma casa que leva, por vezes, 40 longos anos a pagar, também os clubes estão sujeitos a regras e estão restringidos na sua acção, leia-se, gestão.
Medidas que envolvam grandes alterações de plano ou de pessoas têm de ser revistas pelos bancos e depois avalizadas ou, pura e simplesmente, recusadas. Eis o poder económico no seu maior esplendor.
Trata-se, bem sei, de um segredo de polichinelo, mas, mesmo assim, não deixa de ser corajoso que um presidente de clube e de SAD (Dias da Cunha) venha, de forma tão aberta e frontal falar daquela que, assim, bem pode ser considerada uma presidência relativa.
Como relativas são, afinal, todas as presidências, e, neste particular, até mesmo Jorge Sampaio nos poderia, se quisesse, contar alguma coisa de interessante sobre a matéria…