A identidade cultural de Portugal tem o futebol como parte integrante da mesma. Eu não considero futebol como sendo Cultura, seja ela popular, seja ela erudita, seja ela elitista, seja de que género for. A Cultura faz-nos pensar, a cultura é uma ferramenta importante na construção do intelecto, faz-nos ser críticos, a Cultura cria o desconforto intelectual, Cultura é o que fica depois de nos esquecermos de tudo o que vimos, de tudo o que lemos, aquele ímpeto que sentimos frente a determinada situação, é Cultura.
O Eusébio foi parte da identidade cultural portuguesa do século XX. Isto porque o futebol faz parte dessa identidade cultural. O doseamento da importância do futebol para a história contemporânea portuguesa é importante, uns consideram importante o papel do futebol, outros nem por isso. Eusébio foi um ícone cultural para a população portuguesa entre os anos 60 e 80, do século passado. Onde prevalecia a alta taxa de alfabetização, prevalecia uma ditadura, Eusébio foi um ícone de um estado de liberdade que marcou profundamente a nossa história contemporânea. Despertou emoções, uniu um país em torno de um ideal, a pátria, o patriotismo de muitos portugueses media-se pela sua afinidade com a selecção, foi assim, é assim agora. Para mim, ser patriota não é ser um torcedor da selecção, é muito mais que isso. Infelizmente, hoje, o sentido de patriotismo está completamente desfigurado.
Infelizmente, ou não, para muitos portugueses, Eusébio foi mais importante que Fernando Pessoa. Até arrisco dizer que foi mais importante que Camões. Eusébio foi o ícone de uma geração pouco erudita, foi um ícone popular, principalmente por uma população que era alfabeta e agarrou-se ao futebol como um despertar de emoções, de sonhos. Para mim, indo ao cerne da questão, Eusébio no Panteão Nacional é premiar a mediocridade do povo português. É premiar um povo que se agarrou ao futebol por falta de conhecimento, por falta de iliteracia, um povo que um dia conquistou meio mundo, um povo que no passado era ambicioso, era conquistador, que hoje está resignado à sua condição de proletariado.
Com a entrada de Eusébio para o Panteão Nacional será banalizar e mediocrizar um local que devia honrar qualquer português, culto, elitista, analfabeto. Mas, como temos assistido, a maioria dos portugueses adapta-se bem à mediocridade, ao servilismo, por isso, não é de estranhar nada disso. Colocar Eusébio no Panteão Nacional é abrir um precedente perigoso, outros vão exigir a presença de tantas figuras, que, como escrevi anteriormente, tornar-se-á um sitio banal.
Tudo isto trata-se de uma questão de aproveitamento, vão aproveitar a boleia do mediatismo do Eusébio para se promover, para ir juntando migalhas que serão importantes no futuro. E deixa-se levar por isso, quem anda a dormir ou quem anda muito desatento.