Octávio Machado, o Palmelão traído pelo Sistema que ajudou a criar

Comecei este tópico como uma resposta no tópico do Futebol Nacional onde se falava dos irmãos Oliveira, do seu poder no futebol português pós-25A e de um outro que acabou por descarrilar… ou ser descarrilado.

Octávio | Wiki Sporting Machado, o Palmelão que sabe do que está a falar, esteve no Sporting durante 2 anos e meio e, talvez por ter sido o 1º treinador da geração de acólitos do FCP, vulgo “Roquetteira”, teve o mérito de nos devolver um mísero 2º lugar que nos escapava havia 12 anos (escapava mais fora das 4 linhas do que dentro). Mantendo-se no entanto o registo fiel à promessa de Pinto da Costa, que um dia jurou que enquanto estivesse no FCP, o Sporting nunca mais seria campeão nacional.

Octávio Machado ainda voltaria ao clube onde mais brilhou, mas face ao confronto com Jorge Costa e subsequente escorraçar do seu amado Porto em 2002 ao som de mimos como “volta para a tua terra, mouro de m3rda”, foi aconselhado a ficar fora do futebol para não sofrer consequências, ao bom estilo napolitano da Cosa Nostra das Antas.

Contudo antes de se dedicar de vez à agricultura e à política (onde tem sido o cabeça de lista pelo CDS em Palmela sem qualquer sucesso), deixou-nos ainda a revelação de uma encarnação muito diferente daquela que afigurava na golpada de 1980, onde foi o porta-voz de Pinto da Costa, alinhando no grupo de jogadores grevistas conhecido por “Grupo Oliveira”.

Mas comecemos pelo fim, para perceber o contraste:

2ª encarnação: O “Octávio Machado”

Correio da Manhã de 11 Dezembro 2004

CM: Ficou surpreendido com as evoluções do processo ‘Apito Dourado’?
Octavio Machado: – Eu, que ando há quarenta anos no futebol?! Fui a primeira pessoa a falar do sistema. Dez anos antes de Dias da Cunha o fazer. Pensa que alguma vez vou esquecer o que vivi antes do jogo Gil-Vicente-FC Porto na época de Carlos Alberto Silva. Foram os momentos mais traumatizantes da minha vida e da minha carreira. Esse jogo determinava a descida de divisão do Gil Vicente, treinado por António Oliveira, caso a equipa perdesse contra o FC Porto, na altura do jogo já campeão nacional.

CM: Não esquece porquê?
OM: – Porque tive de lutar para que mantivéssemos a nossa dignidade.

CM: Sofreu pressões para que o FC Porto facilitasse a vida ao Gil Vicente?
OM: – Num telefonema chegaram a dizer-me que eu era a única pessoa do FC Porto que desejava a vitória da equipa frente ao Gil Vicente.

CM: Quem lhe telefonou?
OM: – Um amigo. De facto, bem vi aqueles que foram ao balneário do Gil Vicente festejar a vitória da equipa. Perdemos por 1-0, mas não perdemos a dignidade porque não cedo a pressões e disse isso mesmo aos meus jogadores no fim do jogo.

CM: Pinto da Costa deu-lhe a entender que o FC Porto devia facilitar?
OM: – Nunca me diria isso porque me conhece.

CM: Algum dirigente do FC Porto o fez?
OM: – Há muitas maneiras de fazer pressão. Posso apenas dizer que vivi momentos muito difíceis, mas tenho que deixar alguma coisa para revelar no meu livro. Mas não foi a única vez que me aconteceu. Num jogo entre a Académica e o FC Porto em que se discutia a descida de divisão da Académica, também passei por situações difíceis. Acabamos por ganhar com um golo de Raudnei*, infelizmente para alguns, porque não era suposto o FC Porto ter ganho esse jogo à Académica.

CM: Em que época se passa esse segundo episódio?
OM: – Quando Ivic era treinador do FC Porto.

CM: O treinador da Académica era António Oliveira…
OM: – Exactamente.

CM: Foi pressionado, por duas vezes, para não prejudicar duas equipas, treinadas por António Oliveira?
OM: – Vivi momentos muito difíceis."

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1ª encarnação: simplesmente “Octávio”

Comércio do Porto, 17 de Junho 1980

(Excerto do livro “As Manobras de Pinto da Costa”)

[…]No dia 17 de Junho de 1980, estala a primeira bomba. Os jogadores convocam a imprensa e lêem um comunicado de solidariedade para com Pinto da Costa. O treinador, José Maria Pedroto, secundado pelos adjuntos, faz o mesmo. A linguagem utilizada contra o presidente é incrivelmente dura.

O comunicado da equipa técnica começa assim: “Américo de Sá é um traidor.” E prossegue a bom ritmo: “Traiu os interesses do FC Porto desde o momento que aceitou ser deputado. Sacrificou o clube e dirigentes à política. Foi miserável ao não aceitar a recondução de Jorge Nuno Pinto da Costa. Américo de Sá, o deputado, vende a Lisboa o FC Porto. Quer governar de lá, da capital, onde sempre está, e quer calar as vozes livres de quem não aceita este estado de coisas. Esta é a verdade nua e crua. Os sócios do FC Porto serão, como sempre, juízes dos que se vendem. Américo de Sá vendeu-se. É um traidor.” E terminam anunciando que vão sair do clube. Dias mais tarde, Pinto da Costa haveria de se solidarizar com este comunicado, tal como com o dos jogadores.

O posição dos atletas vai na mesma linha da defendida pela equipa técnica, que por sua vez vai na mesma linha da defendida por Pinto da Costa. Os jogadores dizem no comunicado que o clube “corre a mais grave crise de toda a sua história”, que há uma “rendição ao poder que está concentrado em Lisboa” e que estão solidários com Pinto da Costa, a quem chamam de “dirigente ímpar, que nos habitou a uma forma de convivência que só os homens verticais e íntegros conseguem transmitir”.

De referir que este comunicado foi lido por um tal de Octávio, que viria a ser treinador do clube, já como Octávio Machado, e que, curiosamente, haveria de sentir na pele a “verticalidade” e “integridade” de Pinto da Costa.[…]

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*A seu tempo explicarei quem era Raudnei e como é que a Académica, em processo de satelização ao Porto, foi parar à 2ª divisão e lá permaneceu 10 longos anos como pena por desafiar o Sistema.

Dá para perceber que tens um bom arquivo, talvez tão bom quanto o do falecido dr. Pôncio.
Não sabia que o, ainda simplesmente, Octávio tinha sido o porta voz do golpe da criação do monstro.
Sempre achei que o grande crime de Octávio foi, em pleno regresso à casa de partida, em 2001/02, ter permitido que o Sporting disparasse para o título, quando outra criação do sistema, o boavistão, não era suficiente para nos travar ou pelo menos para bisar.
Esse “crime” nunca foi perdoado ao Octávio, nem, aliás, ao Inácio, outro que por lá andou e tb contribui para que o célebre pacto de sangue de PdC fosse, pela 2ª vez em 3 anos, quebrado.
Aguardo pelas cenas dos próximos capítulos

Nem me fales disso… Ainda um dia destes estive a rever o jogo que deu o título ao Boavista no Bessa, na penúltima jornada: 3-0 ao Desportivo das Aves. O primeiro golo é um auto-golo, o segundo golo é descaradamente marcado com a mão! Na época da cacetada tudo valia. Mal por mal, melhor ter ido para o Boavista que para o Porto, mas fosga-se… que aldrabice de campeonato.

Quanto ao Palmelão, agora tem que se dedicar ao Moscatel… senão o Padrinho serve-lhe o jantar. O Inácio é outro que nunca mais se levanta.

Uma pergunta, para a qual não tenho resposta (ou nunca soube ou não me lembro).
A ruptura Octávio/Oliveiras começa quando e porquê? (afinal são duas perguntas)

A definitiva foi quando o Octávio quis ir para a selecção e pelos vistos lhe pediram para dar uma entrevista a falar bem dos Oliveirinhas… ::slight_smile:

Mas pelos vistos eles não se gramavam já desde os tempos em que ambos jogavam no foculporto.

E isso do Octávio na selecção foi quando?
Estou a fazer uma grande confusão ao pensar que Oliveira, Gomes e Octávio foram, entre os jogadores, os cabecilhas do verão quente de 1980, ou melhor, os peões do golpe Pinto da Costa para tomar o poder?
Se sim, não eram unha com carne, pelo menos relativamente ao querido líder?

Na altura em que jogavam juntos eram mais que amigos. O ambiente aquece em 1988 com o episódio Raudnei e a cisão dá-se em 1992 no episódio Gil Vicente acima descrito, quando Octávio Machado foi forçado a ser o bobo da festa… e por se ter insurgido, foi despedido do Porto.

Esse episódio da selecção está relacionado com o período Artur Jorge.

Os livros escritos por pessoas com passado no futebol português têm o estranho hábito, ou não, de passar por uma “limpeza jurídica”. O livro do Fernando Mendes, afirma o próprio numa entrevista aquando da apresentação do livro, foi revisto, revisto, e revisto. Ah, e revisto. Um livro realmente genuíno sobre os meandros do nosso campeonato seria uma obra demasiado sexual para o gosto do homem comum. Futebol seria o aspecto mais desinteressante e secundário do mesmo, tenho a certeza.