O Maior da Aldeia e a mediocridade regional

Após ver este triste Belenenses - Paços de Ferreira resolvi pôr à discussão este tópico.

Existe um fenómeno em Portugal que só não se parece constatar no Minho e Trás-os-Montes.

São as guerrinhas rídículas d’O Maior da Aldeia.

O potencial desportivo do país é muito bom, mas aniquila-se a ele mesmo constantemente, em especial no Centro-Sul do país, talvez vestígios dos Lusitanos e do seu espírito tão resistente quanto ingovernável??

Comecemos por Portalegre. Num distrito de grande tradição futebolística, a AF deste distrito é a segunda mais antiga do país, logo a seguir a Lisboa. Na cidade de Portalegre formou-se inicialmente o Estrela de Portalegre em 1919, seguida pelo rival Portalegrense em 1925. Nos anos 70 e princípio de 80, Estrela e Portalegrense estiveram várias vezes perto da 1ª Divisão, tendo-se anulado mutuamente em especial na época de 1976-77, onde o Estrela fica a um empate da subida com Portalegrense logo atrás. Deste despique fratricida saiu beneficiado o Feirense e depois Espinho, Beira-Mar e União de Leiria, entre outros.

Em Évora temos o Lusitano que esteve 15 épocas no escalão máximo onde ainda alcançou um 5º lugar que hoje daria acesso a uma competição europeia, descendo em 1966 para não mais retornar. Desde aí deu-se um despique fratricida onde por várias vezes Lusitano e Juventude estiveram alternadamente perto da 1ª Divisão. Sendo que tal como em Portalegre, chegaram mesmo a estar virtualmente na 1ª Divisão durante alguns minutos.

Tanto em Portalegre como em Évora houve várias tentativas de fusão dos clubes. Em Portalegre, após falhadas as negociações, emerge o terceiro clube, o Portus Alacer, o que fragmentou ainda mais o futebol local, sendo que o destino final de todos eles foi o encerramento definitivo do futebol sénior e o desaparecimento do panorama desportivo de todas as equipas desta cidade.

No Barreiro é conhecida a rivalidade entre o Barreirense e a velha CUF, dizia-se tal como em Évora e Portalegre que um era afecto ao Benfica e outro ao Sporting. Na sequência do enfraquecimento da cintura industrial de Lisboa, ambos os clubes outrora primodivisionários e com grande currículo não souberam re-inventar-se e as rivalidades bafientas dos velhos sócios resultou em duas equipas fragilizadas que nunca mais conseguiram sair do sobe-e-desce entre a 3ª Divisão e a Distrital, com raros fogachos de sucesso e uma breve e fracassada passagem do Barreirense pela 2ª Liga. Quando o Barreirense teve que abandonar o seu estádio, jogou a muito nojo no velho Alfredo da Silva e assim que pôde, mudou-se para um campo qualquer de relva sintética na Verderena. Existe ainda o Luso do Barreiro, cujos sócios odeiam os outros dois, preferindo andar pelas ruas da amargura da Distrital.

Outras cidades com situações semelhantes existem, como é o caso de Santarém onde os Leões e a União nunca conseguiram pôr de lado as suas afiliações clubísticas, saindo mais uma vez a cidade a perder.

Que sentido fazem estas rivalidades nos dias de hoje? Vale a pena nestas pequenas realidades continuar-se a lutar-se apenas pelo título de Maior da Aldeia?

E será que não faria mais sentido Belenenses e Atlético juntarem-se para melhor sobreviverem?

Um pequeno aparte relativamente ao Barreirense e o agora Fabril, visto de ser residente da área tenho algum contacto com estes 2 clubes.
Depois da venda do estádio e consequente burla dos seus dirigentes, o Barreirense fruto desse ódio que falas caiu no ridiculo de ir jogar a estádios com o do Seixal e do Sarilhense só para não jogarem no estádio Fabril, que é também ele no Barreiro.

Concordo com o que dizes, estas pseudo rivalidades dão muitas vezes em sentenças de morte em alguns clubes.

O Barreirense foi burlado e a culpa irá morrer solteira…que país este. A não junção com o Fabril é fruto de identidades diferentes e eu consigo compreender. Sempre fui Barreirense, nasci na porta ao lado e lembro-me dos tempos áureos do basket. Cresci a ver o Mike como um de nós e vibrei com as suas idas à seleção. Ja ia jogar snooker para a sede ainda antes de ter idade para tal. Já o Fabril nunca me disse nada mas sendo um clube da minha terra, desejo-lhes tudo de melhor (acho que apenas acompanhei o hóquei deles há muitos muitos anos). Se os odeio? Que parvoíce, claro que não, mas são clubes diferentes.

Quanto ao Luso, tenho familiares ex-dirigentes e o meu pai é sócio há cerca de 60 anos e isso do odiar de morte deu-me vontade de rir…não leves a mal claro, só que como vivi essa realidade e nunca me apercebi de tal, custa-me mesmo a acreditar.

Assim escrito parece tudo fácil meu caro. Mas a génese dos clubes está precisamente nas rivalidades que existem. Claro que seria benéfico juntarem-se. Tal como na beira alta o distrito da guarda, cada aldeia tem o seu clube.

Penso que sabes que o Barreiro não é bem uma aldeia. Até posso concordar que seria benéfico para a dimensão dos clubes mas nem só de futebol e primeiras divisões vivem as clubes. O Barreirense e o Fabril trabalham muito a nível das camadas mais jovens e com bastante sucesso no distrito.
E o ponto principal do meu post era mesmo a questão do ódio de morte que, no meu entender, não existe.

Pronto, já retirei as metáforas, concentra-te lá agora no essencial e não no acessório.

Eu sei perfeitamente que em Évora se odeiam, se no Barreiro me dizes que não, estás a dar-me uma novidade que não corresponde à realidade histórica que diz que aceitaram ser clubes pequenos que se anularam mutuamente. Não faz sentido nenhum falar em identidades diferentes num meio mínimo. São cidades pequenas onde as pessoas devem remar todas para o mesmo lado e serem altamente unidas e patriotas com a sua terra em vez de se preocuparem com lutas intestinas.

Será que é difícil admitir que se dividirmos cidades na ordem dos 50 mil habitantes, o destino é a mediocridade? No Norte de Portugal existe um clube por cidade. Onde é que em Guimarães, Braga, Vila do Conde, Póvoa de Varzim, Fafe, Santo Tirso, Matosinhos, etc, alguém pensa em dividir cada cidade em clubes para “identidades diferentes”? a identidade só pode ser uma: a da terra. A rivalidade é para com a terra vizinha. Não é só por causa da tal história de o dinheiro estar no Norte, isso é uma desculpa tradicional para o fracasso dos clubes no Sul.

A grande força dos clubes do Norte advém de as comunidades serem unidas solidárias enquanto aqui as pessoas que vivem na mesma rua odeiam-se, dividem-se, invejam-se e f***m-se umas às outras por dá cá aquela palha, mesmo dentro das próprias famílias. Eu sei bem porque convivo com a realidade das histórias de ódios de gerações em sítios muito pequenos onde as pessoas sentem pouco ou nada os laços comunitários ou orgulho na sua terra. Se nunca viste isso, não sei que te diga.

Ali ao lado, será que em Bilbao pensam em dividir a cidade porque o burguês não pode partilhar a mesa de bilhar com o operário? e em San Sebastián? Zaragoza? Málaga? Granada? Almeria? Elx? Vigo? Corunha? Villarreal? Almeria? Pamplona? Logicamente só cidades com mais de 1 milhão de habitantes (Madrid, Barcelona, Valência e Sevilha) têm espaço natural para serem representadas “identidades diferentes”.

Se formos ver isso por este modo de pensar ate poderiamos pensar em unificar todos os clubes de Lisboa :cartao:

Um bom exemplo de desta discussao poderia ser Funchal com tres clubes (dois deles na primeira liga).

Penso que alem do Norte a regiao de Leiria ou Algarve nao tem tradicao de ter dois clubes em cada localidade ou a cidade de Beja.

Os exemplos do Barreiro, Portalegre e Evora devem-se em parte a rivalidade Sporting Lampioes que e’ mais forte no Sul que no Norte e tb porque a distribuicao geografica e’ muito diferente do Minho. Por exemplo uma rivalidade Braga Guimaraes e’ bem mais forte que essas e estao separadas as cidades por 20 kms.

No Norte por exemplo no concelho de St. M. da Feira houve sempre uma grande rivalidade entre Lamas, Lourosa e Feirense. No Porto existem o fcp mais o Boavista, Leixoes e Sagueiros… E ha a rivalidade Varzim, Rio Ave que basicamente sao a mesma cidade.

Ja agora uma questao: Em Evora o clube mais Sporting e’ o Lusitano, correcto? Sei que em Portalegre e’ o Estrela.

Não sei mais como é que hei-de escrever isto de maneira que se perceba o que estou a dizer. :inde:

eu percebi Viridis :great: No problem

Sei que queres dizer que poderiamos ter um clube de Evora em Portalegre ao menos na segunda liga actualmente se nao fossem estas rivalidades e estou de acordo em vez de um Moreirense ou um Arouca.

Mas temos de ver por exemplo em Moreira de Conegas ha algumas fabricas texteis e o patrao do Moreirense esta ligado a uma que fabrica vestuario desportivo, aquela que faz os fatos de banho da Speedo para atletas olimpicos e isso garante dinheiro a uma pequena vila que esta dentro do concelho de Guimaraes.

Essa discussao de unificar clubes existiu na Madeira, lembro-me bem o Alberto Joao propor que o Nacional e o Maritimo fossem so um clube para que pudesse gastar menos dinheiro em subsidios regionais.

Ja agora o exemplo de Espanha nao e’ um exemplo absoluto. Em Vigo ha o Rapido de Bouzas que estava na terceira liga, esta totalmente dentro da cidade e tem uma rivalidade mortal com o Celta. E o Villareal e’ um suburbio de Castellon que tb tem uma equipa na segunda ou segunda B Espanhola.

Na Inglaterra tens o Sheffield United e Wednesday e nenhum deles esta na primeira liga. E na Franca quando estive em Lille o ano passado descobri que na cidade havia 4 ou 5 clubes de Futebol.

Outro exemplo curioso e’ o Brasil. Pesquisem por clubes de futebol de Campinas, Fortaleza, Belem ou cidades mais pequenas.

nota: longe de mim considerar-te como alguem que queira aproximar os clubes de Lisboa, lembro-me bem o teu espectacular post do Lord of Melons :lol: :lol: :lol:

Mas ja agora outro exemplo, na Catalunha quase todas as localidades tem pelo menos dois clubes de futebol, um pro catalao e outro pro espanhol devido 'a politica. Por exemplo Tarragona tem o Nastic e a Union Espanola ou o Valls tem tres clubes na mesma liga, penso que a primeira distrital a semelhanca do Barcelona e Espanhol.

Ainda o outro post:

O que também chegou a ser questionado nos dias de hoje, é verdade. Os Açores e a Madeira são imensamente remotos e só a partir de 1973 começaram a participar nas ligas continentais. Senão até aí teriam de competir Marítimo A contra Marítimo B! :mrgreen:

Por isso me refiro ao Centro-Sul, a região do Tejo. Há qualquer coisa (e eu sou de cá) que não bate bem. Há muitos ódios internos. O Algarve e o Baixo Alentejo já não são assim.

Setúbal costumava ser um caso excepcional, com um só clube, e a sua maior rivalidade era com os clubes do Barreiro (qualquer um) e com os clubes de Lisboa (qualquer um).

O Porto é uma cidade de grande dimensão à semelhança de Sevilha em Espanha e sempre foi o centro de convergência de todos os serviços do Norte de Portugal, é natural que haja muita diversidade numa cidade que tinha até uma grande comunidade Inglesa. Andam por ali quase 2 milhões de pessoas. Já Leixões é bem na cidade de Matosinhos (e bem lampião), e lá está, são unidos e anti-Porto (seja o Porto, Boavista ou Salgueiros (outros lampiões)).

Feira e Lamas estão no mesmo município mas não são a mesma a cidade. Lourosa também é uma cidade separada, apesar de estar no concelho da Feira. :great:

De certa forma, sim…

Outros dois exemplos curiosos sao Almada e Vila Nova de Gaia, cidades que em habitantes estao no top 10 do pais e que dentro da cidade tem e tiveram mais que dois clubes. Pesquisei agora no Zero Zero :). Mas que nunca tiveram um clube na primeira liga e penso tb na segunda liga.

edit: mas o caso de Portalegre e’ quase comico, estava agora no zero zero e existem dois estadios para tres clubes. Curiosamente o Portus Alacer tem um leao no simbolo. Falamos de uma cidade com muito poucos habitantes. Penso que a menor capital de distrito do pais. Todos esses clubes tem escolas de futebol, ou seja uma boa parte da populacao esta envolvida num desses tres clubes…

E as escolas de futebol destas cidades sempre foram muito boas. Poderíamos ter equipas de 1ª aqui, para reequilibrar o prato da balança. O Paços de Ferreira joga com o Zenit… o Lusitano joga com o Calipolense. Há coisas absolutamente surreais neste país.

Sim, mas esses gajos contam pouco, maior parte do pessoal em Vigo é todo do Celta e tem como grande inimigo o Depor!

Dás-me razão, o resultado é que um anda na 2ª e outro na 3ª. Mas Sheffield é uma grande cidade, como Nottingham ou Bristol. Inglaterra é extremamente urbana e 5 vezes mais populosa e portentosa que Portugal, existem centenas de cidades de 200 ou 300 mil habitantes. Aquilo é gente que nunca mais acaba.

Só um subúrbio de Manchester sozinho como Wigan tem mais de 300 mil habitantes e meteu mais gente em Wembley que o Porto alguma vez havia de sonhar em pôr no Jamor.

Funfact: o Wednesday tem tantos títulos de campeão como o Chelsea e mais que o Manchester City!..

Companheiro, já viste que estás a tentar racionalizar algo que é essencialmente movido por paixão?
Eu percebo o que dizes mas pegando no caso do Barreiro…as sedes do Barreirense e Luso distam uns 50m. Fui sócio do Barreirense e assistia essencialmente ao basket mas sabes quem nos ajudava a ter aulas de educação física num ginásio quando andávamos no preparatório (há mais de 30 anos)? Era o Luso. Era o ginásio deles que era usado pelas escolas que não tinham pavilhão. Ou para aqueles miúdos que não tinham jeito para o desporto, onde achas que tinham a banda onde tocar? Não era no Barreirense. Outro exemplo: o meu pai foi feito sócio do Luso pelo meu avô já falecido. Mesmo em tempos muito difíceis quando o dinheiro escasseava, o meu avô sempre pagou a cota do meu pai que viu o seu tio ser dirigente durante muito tempo. O que achas que o meu pai sentiu quando foi receber o seu Pin de 50 anos de sócio, já o meu avô tinha falecido? E achas que isso alguma vez o impediu de vibrar com as vitórias do Barreirense ou do Fabril?

Claro que podes pegar no meu post e racionalizar tudo o que disse…mas não é assim que as coisas funcionam.
Abraço.

:great:

Eu compreendo isso, mas as paixões de nós indivíduos não podem impedir o progresso do bem comum.