Hoje encarnarei novamente na pele de David Vaitemborough e falarei de animais para fazer mais uma analogia com o nosso querido Sporting Clube de Portugal. Prometo que é a última e doravante empenhar-me-ei em ter uma participação menos lúdica e mais sóbria, com textos de conteúdo mais edificante, caso contrário a Administração do Fórum rescinde com justa causa o contrato com este seu colaborador, por violação dos termos do contrato.
Desta vez não falarei de um animal real como a girafa, mas sim de um animal mitológico:
O grifo, esse animal!
Como todos sabem - e se não sabiam passaram a saber quando viram a gravura em cima - o grifo é um animal mitológico caracterizado pela peculiar condição de na metade posterior do corpo ser leão e na metade anterior do corpo ser águia. É portanto um animal híbrido, tendo provavelmente entrado no imaginário humano por observação de fósseis de Triceratopos (aquele dinossauro que no Jurassic Park sofre uma caganeira monstra e produz um grande monte de bosta) e pelo desejo de projecção, num único ser, das características de dois animais idolatrados ao longo de toda a história humana: o leão e a águia.
Da mesma maneira que as pessoas passaram a associar certas características a cada um dos animais pela observação e pela experiência, por essa mesma observação e experiência passaram as pessoas a associar certas características àqueles que torcem por um clube ou por outro. No caso do Sporting e do beifica, cujos adeptos se auto-denonimam respectivamente “leões” e “águias”, as características reconhecidas a uma facção diferem tanto das características reconhecidas à outra, que os estereótipos de cada um dos clubes evoluíram para a perfeita antítese um do outro. Do benfiquista diz-se que é um indivíduo ordinário, “do povo” e ignorante enquanto do sportinguista diz-se que é um indivíduo excepcional, bem polido pela educação e sofisticado; do benfiquista diz-se que é um indivíduo sem princípios, sem escrúpulos e desonesto enquanto do sportinguista diz-se que é um indivíduo honrado, íntegro e vertical; do benfiquista diz-se que é um indivíduo pouco amigo de tomar banho, arrogante e fala-barato enquanto do sportinguista diz-se que é um indivíduo asseado, cortês e bem-falante. Durante muito tempo (e provavelmente ainda hoje) as características atribuídas ao adepto sportinguista constituíram a excepção e não a regra da sociedade portuguesa, pelo que inevitavelmente convencionou-se dizer que “ser do Sporting é ser diferente” e “ser diferente” tornou-se quase um mandamento da conduta e postura de qualquer sportinguista.
Ora, ultimamente têm-me surgido dúvidas relativamente à legitimidade e alcance desta categorização porque quando vejo certos sportinguistas em certas situações, lembro-me…dos grifos. Os tais que reúnem características de leão e características de águia. Para se perceber o que eu considero como um grifo sportinguista, analisemos alguns casos concretos: o representante máximo dos sócios do clube e Presidente da Mesa da Assembleia Geral, Dr. Dias Ferreira, o Presidente do Conselho Directivo José Eduardo Bettencourt e o paineleiro Dr. José Eduardo Barroso.
Dias Ferreira
Por um lado, o Dr. Dias Ferreira disse uma vez no “Dia Seguinte” que era um “fundamentalista” na defesa do Sporting; por outro lado chegou a advogar um processo judicial que Carlos Queiróz instaurou ao Sporting. Por um lado tem uma estimável e nobre profissão como bom sportinguista; por outro apresenta-se sempre no “Dia Seguinte” com um vácuo de ideias e de conteúdo na defesa do Sporting e produz escritos de baixo nível, chamando nomes às mães daqueles que se manifestam contra o estado do clube, como se fosse um beifiquista. Por um lado, nunca se coíbe de fazer em público referências à educação que teve, para propalar a sua integridade e rectidão típicas de um sportinguista; por outro lado é conhecido pelas piruetas que deu na sua posição e opinião perante o estado do clube e das pessoas que o dirigem. Por um lado apresenta-se sempre de gravata porque é uma peça de vestuário elegante e adequada à imagem que quer fazer passar; por outro lado, não tem qualquer pudor em palitar os dentes na TV em directo, como se estivesse numa tasca a ver um jogo do glorigozo.
José Eduardo Bettencourt
Por um lado diz-se “demasiadamente sportinguista” para despedir Paulo Bento, um benfiquista transformado em ídolo pela cultura de mediocridade em que o clube vive; por outro lado não teve grandes problemas em despedir o eterno Vítor Damas por carta. Por um lado, como sportinguista que é, tem no currículo todas as qualificações exigidas a um grande gestor e administrador da área comercial do Banco Santander (a avaliar pela sua prestação nos últimos meses, provavelmente geria a capacidade de vender trapaças aos clientes do Banco); por outro lado dá-se a demagogias como dizer que “Paulo Bento é forever” ou revelar que vai ganhar menos do que um jogador do clube, como se fosse o dono da mercearia da esquina que está na tasca do bairro à conversa com os amigos. Por um lado, arroga-se dono de um certo nível e de uma certa postura para justificar porque é que não pode descer ao nível de outros e participar num debate ou defender o clube das agressões externas; por outro lado, solta em directo para a rádio um “você não quer que o Paulo Bento me mande à merda pois não?” na primeira entrevista que dá como presidente.
Eduardo Barroso
Por um lado é um respeitável e competente cirurgião; por outro lado não demonstra grandes dificuldades em descer ao nível lampião tal como fez quando insultou e ofendeu da forma mais vil e desprezável o Sr. Paulo Pereira Cristóvão durante a campanha eleitoral. Por um lado, diz-se um grande sportinguista porque é sócio há não sei quantos anos e nunca interrompeu o pagamento de quotas; por outro lado, tal como um batoteiro benfiquista, não se importa que o Sporting ganhe nem que seja, passo a citar “por meio a zero e com um penalty roubado no último minuto do prolongamento”. Por um lado, tal como um sportinguista sofisticado e de gostos refinados, gosta de dissertar sobe charutos cubanos; por outro lado, não se faz rogado em frente a uma queijada de Sintra e lambuza-se todo a comê-la em directo durante o programa televisivo em que participa.
Pedro Afra
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Não podia terminar sem uma breve menção ao Director de Marketing, Pedro Afra, que segundo o que se conta , chegou a propor como equipamento alternativo um equipamento de cor vermelha…um vermelho à Sporting, segundo disse o próprio.
Conclusão:
Num momento em que se invoca com tanta recorrência o estigma do “verdadeiro sportinguista” e a mensurabilidade do sportinguismo de cada um, fico com a dúvida, que espero que me ajudem a esclarecer: existirá de facto uma dicotomia de carácter entre sportinguistas e benfiquistas? Será o Sportinguista médio significativamente diferente do benfiquista médio na sua postura e atitude, no desporto e na sociedade? Se sim, como se explica a prevalência de traços “benfiquistas” em personalidades de tanto relevo do Universo leonino como as acima mencionadas? Terá o momento negro que o clube atravessa contribuído para atenuar as características originalmente atribuídas ao leão, tendo sobressaído outras menos desejáveis? Ou será que o clube foi roubado àqueles que construíram a ideia e imagem do clube por outros que agora se aproveitam dele como aves da rapina ou aves necrófagas?
Seja qual for a resposta, uma coisa é certa: entre proclamar-se e ser-se ainda vai uma grande distância. E em alguns dos casos acima mencionados, a auto-proclamação de sportinguismo assume contornos de um pedantismo patológico, que é, ele próprio muito pouco condizente com o clube. Basta olhar para o leão rampante do símbolo: ele não diz que está em pé, nem diz que se vai pôr em pé. Simplesmente…mantém-se em pé.