[center][size=15pt][b]Obama compara Souto de Moura com Thomas Jefferson[/b][/size][/center]
Barack Obama enalteceu o trabalho de Souto Moura na entrega do prémio Pritzker 2011, comparando-o com o norte-americano Thomas Jefferson.
O presidente norte-americano afirmou hoje que Eduardo Souto de Moura, prémio Pritzker 2011, “redefiniu as fronteiras da sua arte”, a arquitectura, servindo simultaneamente o “bem público”, comparando-o com um dos ‘pais’ dos Estados Unidos, Thomas Jefferson.“Como Jefferson, [Souto de Moura] passou a sua carreira não apenas a redefinir as fronteiras da sua arte, mas a fazê-lo de maneira que serve o bem público”, disse Barack Obama na entrega do Pritzker 2011 ao arquitecto português, em Washington. Ao lado da primeira-dama, Michelle Obama, o presidente enalteceu “as formas simples e linhas limpas” dos trabalhos de Souto de Moura, que se enquadram facilmente no ambiente circundante.
“Souto de Moura desenhou casas, centros comerciais, galerias de arte e estações de metro, tudo num estilo tão natural quanto belo. É um especialista no uso de diferentes materiais e cores”, adiantou o presidente norte-americano.
Obama fala do Estádio de Braga
Obama adiantou que o Estádio de Braga é “talvez a obra mais famosa” do arquitecto portuense, relevando em particular a solução de construí-lo ao lado de uma montanha.
“Também teve grande cuidado para posicionar o Estádio de maneira a que quem não possa ter bilhete pudesse ver o jogo dos montes circundantes. Como o [estádio de basebol em Chicago] Wrigley Field, em versão de Portugal”, ironizou.
“Essa combinação de forma e função, de arte e acessibilidade é a razão porque hoje honramos Eduardo com o prémio que é conhecido como o Nobel da arquitectura”, disse o presidente norte-americano.
A assistir estiveram o secretário da Educação, Arne Duncan, e outra personalidade de Chicago próxima de Obama, o atual mayor da cidade, Rahm Emmanuel, além do congressista republicano Eric Cantor.
Apresentado por Thomas Pritzker, presidente da Fundação Hyatt, como um aspirante a arquitecto que acabou por tornar-se no “arquitecto em chefe” dos Estados Unidos, Obama aceitou o repto e gracejou que “esperava ter sido mais criativo”, mas acabou por “ter de ir para a política”.
Destacou ainda a importância da sua cidade natal para a arquitectura internacional, enquanto berço dos arranha-céus e origem de grandes nomes do campo como Louis Sullivan, Frank Lloyd-Wright ou Frank Gehry, que estava entre os presentes.
Arquitectura que se transforma em arte
No evento da fundação da família Pritzker, que também tem raízes em Chicago e esteve envolvida no financiamento de várias campanhas de Obama, incluindo a das últimas presidenciais, este lembrou também que a sua última sede para as presidenciais de 2008 foi num edifício baseado num projeto de Mies Van der Rohe.
“Durante dois anos enchemo-lo de pessoas a sobreviver com nada mais do que pizza. Não tenho a certeza se era o que Mies tinha em mente, mas funcionou bem para nós”, gracejou Obama.
“A arquitectura é sobre criar edifícios e espaços que nos inspiram, que nos juntam e nos ajudam a fazer o nosso trabalho. E que, no seu melhor, se tornam em obras de artes por onde podemos andar e viver”, adiantou.
“Por isso, a arquitectura pode ser considerada a mais democrática das formas de arte”, adiantou o presidente norte-americano, a pouco mais de um ano das próximas eleições.
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[center][size=15pt][b]Discurso de Souto de Moura ao receber o Pritzker[/b][/size][/center]
Exmo. Sr. Presidente dos EUA, Presidente do Júri, elementos do Júri, meus Amigos, minhas Senhoras e meus Senhores,
Só quando recebi o convite dizendo “Eduardo Souto de Moura of Portugal” é que acreditei que tinha ganho o Pritzker 2011. Não posso esconder que fiquei feliz, por mim, pela minha família, colaboradores, amigos e clientes. Em nome de todos, os meus sinceros agradecimentos.
Aprendi a desenhar na Escola Italiana do Porto, cidade onde nasci, e no liceu decidi ser arquitecto. Não é que tivesse alguma paixão especial pela disciplina, mas na crise agnóstica dos 15 anos, duvidei se Deus devia ter descansado ao 7º dia. É que, pensando bem, ficou por fazer uma geografia como a de Delfos, a Acrópole para receber o Parténon ou secar um pântano no Illinois, onde a Farnsworth pudesse ficar.
Em 1975 depois da Revolução dos Cravos, comecei a trabalhar com o Arqº Siza Vieira. Não só pela arquitectura, mas sobretudo pela pessoa em si, foi uma experiência excepcional que ainda hoje continuo a fazer com o mesmo prazer. Saí do seu escritório nos anos 80, para ser arquitecto. Foi difícil começar, mas usar a sua “linguagem” parecia-me uma traição e mesmo que o quisesse, não o conseguia fazer, por pudor.
Depois da Revolução, e restabelecida a Democracia, abriu-se a oportunidade de redesenhar um país, onde faltavam escolas, hospitais, outros equipamentos, e sobretudo meio milhão de casas. Não era certamente o Pós-Modernismo, na altura em voga, que nos poderia resolver a questão. Construir meio milhão de casas, com frontões e colunas seria uma perda de energia, pois a ditadura já o tinha ensaiado. O Pós-Modernismo chegou a Portugal, sem quase termos passado pelo Movimento Moderno. É essa a ironia do nosso destino: “antes de o ser já o éramos”.
Do que precisávamos era de uma linguagem clara, simples e pragmática para reconstruir um país, uma cultura, e ninguém melhor que o proibido Movimento Moderno poderia responder a esse desafio. Não era só um problema ideológico, mas sobretudo de coerência entre material, sistema construtivo e linguagem. Se “arquitectura é a vontade de uma época traduzida num espaço”, Mies van der Rohe abriu-nos as portas na redefinição da disciplina tão massacrada até aí, pela linguística, semiótica, sociologia e outras ciências afins. O importante é que a arquitectura fosse “construção”, assim com urgência, nos pedia o país.
Com 10 séculos de História, Portugal encontra-se hoje numa grande crise social e económica, como já aconteceu em vários períodos anteriores. Hoje, como ontem, a solução para a arquitectura portuguesa é emigrar. Como dizia Paul Claudel: “Le Portugal est un pays en voyage, de temps en temps il touche l’Europe”. Resta-nos a “mudança”, como quer dizer a palavra “crise” em grego. Resta-nos decifrar o significado dos dois caracteres chineses que compõem a palavra “crise”: o primeiro significa “perigo”, o segundo “oportunidade”. Em África e noutras economias emergentes não nos faltarão oportunidades, o futuro é já aí. “Trabalhar na transmutação, na transformação, na metamorfose é obra própria nossa.” (1)
Muito obrigado.
Eduardo Souto de Moura
(1) Herberto Helder, “O Corpo. O Luxo, A Obra”
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