Se bem que o termo internacionalização não tenha uma conotação negativa ou positiva à 1.ª vista, pode, consoante a conjuntura e as circunstâncias, os ciclos ou fases, ser interpretada de formas distintas. Neste caso, aplicado ao futebol do Sporting e à sua estrutura do plantel principal de futebolistas profissionais, levanta algumas questões ou pelo menos dá que pensar.
Desde logo porque o modelo defendido até à bem pouco tempo era a aposta na formação de futebolistas da casa, nas escolas do Sporting, que apostou bastante na criação de uma Academia que pudesse melhorar as condições da já prestigiada “cantera” (não gosto do estrangeirismo, mas à falta de outra expressão tão habitual e elucidativa, lá terá de ser). A aposta era também, a nível não só de formação, como de futebol profissional, a aposta no jogador português, e o Sporting orgulhava-se de, num sistema tão agreste para o jogador nacional (como na generalidade da sociedade portuguesa actual, onde só o que vem de fora e nos é imposto de círculos extra-fronteiriços é que é bom e tem valor e é válido), ser o único Clube de grande dimensão que fazia a defesa e a promoção desse jogador. Havia não só uma habitual maioria de jogadores portugueses na equipa principal, como penso que também no plantel.
Por vezes dizia-se que um dos principais motivos para isso era a desorçamentação do futebol do Sporting e da falta de recursos para investir, além de uma mais racional e menos onerosa e arriscada gestão de recursos humanos e financeiros. Esse factor também deve ter o seu peso na avaliação da política para o futebol seguida até então, se bem que a formação e a promoção dos jovens atletas nacionais seja um traço característico e transversal a quase todo o Clube, nas suas várias valências e modalidades desportivas.
Mas de repente, de uma época para outra, tudo mudou. Com esta direcção e estrutura de futebol, aparentemente, numa época, tudo mudou. O dinheiro parece abundar - só pode, com tanta reestruturação financeira, [i]project finances[/i], fundos, investimento angolano, parcerias, antecipação de receitas, empréstimos obrigacionistas, etc, só tem que haver investimento no plantel, não esbanjamento, mas investimento sério e aposta no sucesso a curto prazo do Sporting. Porque o Sporting tem obrigação de ser Campeão todos os anos, mas nestes próximos mais do que nunca, dada a nova estrutura totalmente feita à medida da nova direcção empossada, com um treinador escolhido a dedo, com tudo feito ao seu critério. Mesmo assim há que convir que ainda estamos aquém no que toca a ter um plantel completo, fechado e suficientemente apetrechado e capaz. Alguns passos foram bem dados, outros deixam muito a desejar. Há um novo ciclo que tem de começar e ser sustentado, ter solidez mas ao mesmo tempo ter capacidade de adaptação, de melhoramento, de evolução e rentabilização. Joga-se muito, nos próximos tempos. E muito há que definir.
O Sporting já contratou “uma nova equipa”, hipérbole que se aplica relativamente ao número de aquisições feitas (cerca de 11 jogadores, todos eles estrangeiros), o que necessariamente implica a saída de outros tantos, pelo menos, aproximadamente. O que é facto é que saíram ainda mais alguns e outros serão emprestados. E dos que saíram, há alguns portugueses, além de que os júniores aparentemente ficaram (ficarão ?) tapados no plantel: Cédric, Wilson Eduardo, para citar bons exemplos, mas há mais 2 ou 3 que até estão a trabalhar no arranque de época na Academia, mas que vou preservar a estas andanças, além de que alguns séniores já formados vão ser dispensados ou cedidos por empréstimo (Salomão - apesar de não ser das escolas, é aposta no jogador português, Saleiro, mais 2 bons exemplos). Além disso há séniores de carreira feita que também vão sair, uns por não se terem imposto no Sporting, outros por algumas limitações que apresentam e problemas com lesões ou falta de forma, além de outros motivos. Falo de Maniche, Caneira (nada a obstar, não é por serem portugueses que têm lugar no plantel) Pedro Mendes (parece que não fica, para renovação do plantel e porque as exigências competitivas talvez sejam demasiado elevadas para um jogador que tem tido algumas lesões impeditivas). Fora jogadores que têm rodado, são da formação, e mais uma vez não terão lugar no plantel, para que venham estrangeiros mais novos, menos adaptados e rotinados ao nosso futebol, de reduzida experiência. Falo de Adrien, Pereirinha, e mais exemplos poderia dar. É muito jogador português, de todas as idades, perfis e posições, dos júniores aos veteranos, de principiantes a “finalistas”, no plantel, emprestados ou recém-adquiridos ou formados, a ficar fora das contas. E são aproximadamente 11 os novos jogadores, todos estrangeiros, que entram.
Também é verdade que parece que vão sair vários jogadores estrangeiros, porém, não sairão certamente 11, directamente do actual plantel.
A “internacionalização” ou “estrangeirismo” do novo SCP faz-se com uma mescla de jogadores de potencial elevado, muito novos e promissores, mas inexperientes e que terão de se adaptar, com jogadores mais experientes e evoluídos, já maturados, que poderão dar um bom contributo. Todos, excepto Rodríguez e Luís Aguiar, vindos de Braga, ingressam pela 1.ª vez no futebol português. Muitas questões se levantam, há muito para (re)pensar.
Conseguirá a “nova equipa contratada”, o reforço que representa a “guarnição estrangeira”, harmonizar-se a curto médio e longo prazo com a essência formadora e de promoção, traço da cultura desportiva do Sporting? Ou este é o primeiro passo para inverter essa tradição e esse carácter ímpar em Portugal?
Será que estamos a assistir à construção e fortalecimento de um Sporting Clube de Portugal mais dominador, mais audaz, mais vencedor, que honre os pergaminhos do Clube, como grande Clube Português, Europeu e Mundial, ou pelo contrário, se prepara uma nova “machadada” no tronco da estrutura desportiva e futebolística do Sporting?
Estamos perante a desvalorização interna e o abandono do trabalho desenvolvido pela Academia, ou estaremos perante uma fase transitória de readaptação da equipa?
Estamos a garantir o futuro ao jogador português e formado na Academia Sporting, ao mesmo tempo que garantimos o futuro do SCP e a sua competitividade e capacidade, ou estaremos a formá-los para depois os dispensar, para que outros os aproveitem, continuando a delapidação desportiva, financeira e patrimonial do Clube que dura à várias épocas e tem responsáveis identificados?
A Academia é encarada como lugar por excelência da formação e promoção leonina do jogador português, da cultura e tradição Sportinguista, de reforço do Clube e do seu papel na sociedade e no desporto, ou agora é um activo imobiliário a trespassar, à primeira oportunidade, como foi outro património imobiliário que era do Clube e foi alienado, mesmo no âmago do Reino do Leão, ao Estádio José Alvalade?