Nos dias de hoje sente-se a mudança no futebol português. Os paradigmas alteram-se, as percepções mudam, os pilares tremem perante o súbito acordar das placas tectónicas que o fundamentam. Mas nem toda a mudança tem cariz positivo, libertador.
O Sporting volta a ser leão, com um instinto devorador aguçado, decidido a derrotar os usurpadores que tomaram conta da selva. O “status quo”, calcificado por décadas de impunidade, tarda em reagir a este leão, solto de correntes e farto da submissão. Este despertar felino tem a cara de Bruno de Carvalho. As águas agitam-se e a penumbra inquieta-se para, algumas vezes, revelar um teor ainda mais turvo do que aquele que se imaginava.
Num volte face rocambolesco, o Sporting passa a ser o intimidante, o papão da arbitragem, Isto porque deu largas à sua indignação, fartou-se do ciclo de banalidade que “o roubo ao lagarto” trazia. Para uma classe arbitral pouco habituada a ser verdadeiramente questionada publicamente, esta indignação causa incómodo porque, para eles, tudo está bem.
Para os abutres negros do apito, a mudança está a acontecer, mas não querem que a mesma seja pública. O famigerado “sistema” mostra fragilidades, falta de eficácia, talvez corroído pela marcha inexorável dos tempos. Para os abutres, criados a devorar os restos de carne dos mais frágeis, trata-se apenas de um regresso a um passado distante. Esvoaçam, desavergonhadamente, da torre das Antas para estabelecer novos ninhos nas placas de fibra de lã de um estádio mais a sul.
Entretanto, o abutre-mor, clama com ar tristonho, que nos esquecemos da faceta humana do arbitro: “O arbitro é marido, pai, irmão, um ser humano” diz ele, tentando vitimizar um vilão que vive em permanente impunidade. Aceitemos portanto o desafio: olhemos para o homem do apito apenas como uma pessoa, alguém com quem partilhamos a sociedade em que vivemos. Mas façamo-lo à luz dos factos.
As “malditas” escutas do Apito Dourado são reais, se bem que invisíveis para a justiça. Nessas escutas, metaforicamente (mas com uma crueldade inegável), dirigentes negoceiam o tráfico obscuro que preenche os bastidores do nosso futebol. As metáforas servem também ao público em geral: falar de fruta e de café com leite fere menos o ouvido do que falar em favores sexuais e prostituição. É neste contexto factual que aceitamos o desafio de Vítor Pereira e questionamos os árbitros como pessoas e não pelo papel que desempenham no terreno de jogo:
“Que espécie de pessoa, que espécie de marido, pai, irmão é um individuo que trai o mais nobre dos valores familiares em troca de relações sexuais com prostitutas?”
Neste tempo de mudança, não sei o que desprezo mais: se um arbitro corrupto ou um homem sem carácter.