A eleição da actual direcção, foi um verdadeiro soco no estomago. Daqueles que nos fazem passar uma noite em claro e que quando finalmente se consegue fechar os olhos por um par de horas, ao acordarmos desejamos com todas as forças que tenha tudo sido um pesadelo. Não queria acreditar que a um conjunto de pessoas com um comportamento pouco ético numa campanha eleitoral cujo epílogo se tornaria histórico pelas piores razões, várias com responsabilidades, no passado, na decadência desportiva e financeira do Sporting Clube de Portugal, o destino tinha brindado com a honra de gerir este clube.
Para quem se fartou de ver os mesmos rostos à frente do Sporting, a mesma linha de pensamento e sentir o clube e está visceralmente contra toda o polvo criado na defesa dos interesses instalados, naturais quando o poder se prolonga durante o tempo e as figuras do “tachismo”, do “amiguismo” se tornam quase que intrínsecas, a direcção de Godinho Lopes era uma afronta. Um insulto. Acresce a isto um desenlace digno de um filme de terror, proporcionado por estatutos caducos, anti democráticos, a falta de rigor e o amadorismo no processo eleitoral, com resultados pouco esclarecedores e sobre os quais haverá sempre dúvidas, com o novo presidente do Sporting a fugir dos próprios adeptos.
Godinho Lopes sabia que não teria a vida fácil. Sabia, pese um certo conformismo dos Sportinguistas, dos anti corpos que criou no universo verde e branco. Tinha a seu favor, os notáveis e ex notáveis do clube, disseminados pela comunicação social, determinados na sua função de opinion makers em passar a palavra. “União”. Tinha a seu favor também, a prioritização de alguns sectores claqueiros, focados em não perderem os privilégios adquiridos, dos seus interesses enquanto grupo, aos que decorrem de ter opinião própria no que se refere ao clube. Por último, tinha a seu favor, o relacionamento com a banca. Godinho Lopes fazia parte do ADN de gestor de topo que não colocaria em causa, negócios do passado, tão querido pelos banqueiros.
Não é difícil, contudo, no futebol e quando se vive com a emoção, fazer esquecer o passado. As notícias de milhões disponíveis, mesmo sem saber a origem; a vassourada a um plantel com um desempenho desportivo insatisfatório e que como tal, induz a desejos de terra queimada por parte dos adeptos; jogadores novos a chegarem em catadupa, com grande pompa e circunstância; um treinador com competência reconhecida por quase todos… levaram os Sportinguistas aos estádios, novamente. Não só a Alvalade, mas a todo o país. Foi um sinal da força do clube, do amor dos Sportinguistas ao mesmo, que independente das suas convicções em matérias estruturantes, querem sonhar com o sucesso, precisam de sonhar, aliás.
Tenho dito que Godinho Lopes não tinha um plano. Isto não é inteiramente verdade. O presidente do Sporting detectou a sede dos Sportinguistas pela aposta forte em títulos. O seu cansaço por discursos economicistas e de rigor financeiro. Optou, até porque era preciso ganhar eleições, por fazer um brutal investimento no futebol. Tinha luz verde da banca para utilização de linhas de crédito, tinha activos que poderia hipotecar e vender parcelarmente, tinha parceiros para o apoiar nesse investimento. Gastar forte, para colher forte mais tarde. Afinal, em linha com o que muitos queriam. Mesmo os críticos. Ou alguns dos críticos.
Uma intenção, um plano… um “projecto”, contudo, além dos meios financeiros eventualmente disponíveis, precisa dos meios humanos para uma alocação correcta e competente dos recursos. Os investimentos têm que se direccionar para activos que sejam mais valias e realmente necessários, a gestão desses activos tem que ser capaz de os potenciar. No caso do futebol, a orientação técnica, táctica, motivacional dos jogadores tem que ter por suporte, uma estrutura capaz de exigir, exigir com responsabilidade, definindo objectivos e providenciando condições para que os mesmos sejam atingidos. Ora aqui, falhou-se redondamente. Godinho Lopes cometeu o erro de escolher pessoas que não se complementavam e que não tinham capacidade para as suas funções, em vários departamentos “core”. A falta de liderança do presidente, além de nunca ter conseguido aglutinar a equipa por ele escolhida e gerida, desagregou-a. A fogueira de vaidades onde têm ardido os dirigentes foi mais forte, mais uma vez.
Caem os vice presidentes, cai o treinador do “projecto”, caem os homens que seriam as traves mestras do futebol, cai mais um treinador. E mais outro. E mais outro. A equipa de futebol, que teria tido sempre a vida difícil, tal a revolução feita, depois de um período que soube segurar as pontas, foi-se desagregando pois não havia quem lhe desse a mão. O dinheiro começou a faltar e as vendas dos passes dos jogadores, às parcelas, foi-se sucedendo. Venderam-se jogadores importantes por preços irrisórios e em momentos pouco comuns, para um clube que precisa de vender bem. Começaram a ser evidentes os erros de casting na escolha da maior parte dos jogadores, que produziam pouco e eram demasiado caros. A equipa foi perdendo capacidade competitiva até a um ponto pouco visto na história centenária deste clube. Bateu-se no fundo. A intenção, o plano… o “projecto”, falhou em toda a linha. Os investidores exigem o dinheiro que colocaram num clube que desvaloriza activos, a banca, mais uma vez, finca o pé e ordena uma inversão completa de rumo. Mais uma vez, colocou dinheiro nas mãos de um dirigismo pouco capaz e que destrói valor. Mais uma vez, decide um rumo para este clube e exige que este seja cumprido.
E é o que tem feito Godinho Lopes, nestes dias. Por ordem de terceiros. Limpa os destroços de ano meio de disparates.
Que não haja dúvidas, que desde a campanha eleitoral última, que se criaram facções com posições exarcebadas como nunca. A palavra “ódio” encaixa perfeitamente para descrever o extremismo latente. E este divisionismo não se resolve, na minha opinião, pela recorrência a “consensos” que tenham os mesmos intervenientes do nosso dirigismo dos últimos anos ou que tenham sido sempre solidários com gestores que falharam redondamente. Não pode. A capacidade de análise, a vontade para a mesma, o reconhecimento do que foi mal feito e por quem foi feito, a exigência com quem dirige o Sporting, são condições que considero essenciais para quem vier a seguir. Se vier.
Falhou-se tremendamente, durante demasiado tempo. O que provocou uma crise identidade profunda, os tais extremismos, mas também a resignação e o conformismo. Criou-se, por outro lado e também, uma zona de conforto, onde é evidente o desejo que não se levantem ondas, não haja turbulência e posições de força ( não no sentido bélico, mas na natural expressão de convicções fortes ) não são bem vindas, não são desejáveis. Não deixam as pessoas confortáveis.
Sou de opinião que Bruno de Carvalho, certamente com responsabilidades no processo e estando para descobrir o que deseja para o clube nesta fase e quais são as suas soluções, deixou de ser uma opção forte ( partindo do principio que o foi e isto, que como em tudo, é preciso mostrar trabalho e capacidade), para ser uma opção possível e ( ainda muito ) provável. Revejo-me em várias das suas posições, não o escondi. Em várias, por antecipação. Mas assumo que se tornou um ponto forte de discórdia e dos tais extremismos, em parte sem culpa, tão evidente a tentativa de personalização no ex candidato, das posições dos insatisfeitos com o dirigismo do Sporting, que muitos já o eram e convictamente, muito antes de Bruno de Carvalho se ter tornado figura pública. E sabemos, até pelo histórico neste espaço, que essa insatisfação não significa nem significou o apoio, muito menos incondicional ao chamado líder da oposição.
O desejável, para mim, era uma candidatura livre de cumplicidades com os últimos anos do situacionismo. Essas cumplicidades ( por acção e omissão ) com esta fase final da Continuidade, não têm perdão. Lamento, não consigo ver qualquer cabimento nas mesmas. E sem os anti corpos criados pelo Bruno de Carvalho, vários sem ter a mínima responsabilidade, repito. É até onde vai o meu desejo por moderação e consensos. Não deixando cair a necessidade de responsabilização, pelo menos como forma de disciplinar os Sportinguistas, quanto à necessidade de exigir e de não pactuar com gestões muito perto de danosas e que hipotecaram o futuro do clube. Que o subalternizaram e pior, adulteraram os próprios valores do clube.
Estamos perto de um momento histórico do Sporting Clube de Portugal. Graças a um conjunto de sócios, os Sportinguistas têm a possibilidade de mostrar à navegação que não existe mais espaço para a mediocridade, a falta de transparência e de seriedade, neste clube. Que este momento sirva para a mudança e como um alerta para o futuro.
Deixo-vos com um pequeno vídeo de um filme que muitos conhecem. Creio que traduz um pouco a seriedade deste momento para o nosso clube.