Que pena... Não ganhou o Futre!

Não sabia onde encaixar isto, por isso aqui fica:

[i]Desde que protagonizou a célebre conferência de imprensa do chinês, Paulo Futre voltou para a ribalta e foi agora contratado pelo Licor Beirão para dar a cara pela nova publicidade do grupo.

A campanha feita agência Uzina Publicidade terá outdoors, mupis, televisão e também estará na Internet. “Sócio, queres ganhar um Porsche igual ao meu?”, é um dos slogans da campanha, que terá ainda um concurso onde pode ganhar um bólide amarelo igual ao do ex-jogador dos três grandes portugueses.[/i]

[youtube=425,350]http://www.youtube.com/watch?v=kJDeb-0hIMs[/youtube]

Nem sei o que pensar disto… Resta-nos tentar levar tudo com humor.

Só mesmo o Futr€ …

Devia era ser escorraçado do SCP. Camaleão fdp!

Ainda quero ver o resultado final do anuncio

A brincar a brincar conseguiu promover-se… :whistle:

Só de pensar que algumas pessoas achavam que este desgraçado tinha algum tipo de qualidades para o lugar :inde:

Saiu-lhe a sorte grande. Voltou á boca dos portugueses e agora promove-se á custa da sua idiotice. Ainda fez a figura ridicula de ir para um programa falar sobre o assunto , como se tudo aquilo tivesse sido propositado. Até tenho pena porque as pessoas gozam com ele , o programa da tvi foi a gozar com ele…e eu acho que ele nem se apercebeu. É triste. A sua postura e acima de tudo o envolvimento desta personagem medonha , nojenta e sem escrupulos numas eleições que se queriam sérias.

:arrow:

Até acredito que se aperceba, mas há uma coisa superior: €

http://aeiou.expresso.pt/gen.pl?p=stories&op=view&fokey=ex.stories/643988

Os gajos da Licor Beirão não brincam em serviço… e o Futre vai voltar a andar na boca das pessoas e ganhar mais uns trocos…

Lá pode de encaixe ele tem.

E não é nada burro, podia seguir com a vidinha dele e ficar chateado com o circo todo à volta disto. Mas não, vai tirar daqui uns belos trocos. Isso ele sempre soube fazer bem.

Que verdadeiro escarro esta personagem :arrow:

O fulano foi é esperto ao ter vindo com aquela história do chinês, já sabia de certeza que iria ter um contrato publicitário chorudo.

Malta, era só para informar que optei por fundir os dois tópicos sobre a comicidade desta personagem.

Que tristeza! E a cena do concurso do porsche:

O vencedor será quem apresentar a melhor "[b]ideia à Futre[/b]" para salvar Portugal.

Epá, esse gajo não tem mesmo noção. ^-^

Epá deixem-no estar. Foi vergonha nacional durante uns dias, agora que colha os frutos dessa exposição mediatica, até já estava com pena dele.

Pode ter porches e uma mao cheia de dinheiro e imobiliario, mas deve ser lixado saber que o mundo inteiro goza connosco, ainda mais nesta era one informação se propaga a alta velocidade.

By the way, eu nao vou começar a beber mais beirao por causa disto.

Eu acho que ele faz agora crónicas para Ojogo.

Estes gajos até a maior cagada que façam dá ouro… ca pu*a de trampa de súcia… :wall: :wall: :wall:

A única coisa que não me deixa chatear-me tanto nesta situação é que, para mim, nunca liguei esta personagem ao Sporting… para mim… é um chulo que anda para aí a tentar arranjar tacho.

Entrevista ao Sol:

[size=12pt]Parte 1[/size]

Como preferes que te trate? Por tu?

Porra! Queres chamar quê, senhor? Isso não existe no meu vocabulário.

Que memórias tens da tua infância no Montijo?

Do meu grupo de amigos. Éramos uns bandidos, entre aspas. Sempre com a bola.

O que faziam além de jogar futebol?

De tudo. De meter respeito aos betinhos até roubar. A grande maioria era de famílias humildes. Alguns passavam fome, eu não. Em minha casa havia sempre comida, nem que fosse pão com açúcar ou sopinhas de leite.

Roubavas por rebeldia?

Mais pelas companhias. Não roubava para comer, mas por um chocolate talvez.

Integravas-te facilmente?

Menos nos betinhos. No Montijo havia o café dos ricos e, dividido por um beco de um metro, o café dos pobres. Eu ficava com os da minha classe social, mas tinha uma mais-valia. É que os betinhos queriam jogar à bola comigo. Dava-me bem com todos por causa do futebol

Tiveste problemas com a Polícia?

As balas passaram-me sempre ao lado. Uma vez vinha de um jogo e tinham ido todos dentro. Foram assaltar a escola do Montijo. Eu tive sempre sorte, também porque era protegido pelo grupo. Já estava no Sporting e tiravam-me sempre do filme. Muitos estiveram presos mais tarde e fui vê-los à cadeia.

Quantas pessoas viviam em tua casa?

A minha avó, o meu pai e a minha mãe no quarto e eu e o meu irmão no sofá-cama, com o penico. Não havia casa-de-banho. Mais tarde o meu pai fez a casa-de-banho e mais um quarto. Ele era um grande jogador de cartas, era o ‘Pelé da Loba’, um jogo típico aqui da zona, e num Verão ganhou dinheiro para as obras. Eu e o meu irmão passámos a ter cada um a sua cama.

O que faziam os teus pais?

A minha mãe era doméstica e o meu pai era empregado de escritório.

Davas-te bem com o teu irmão?

Sim, apesar dos oito anos de diferença.

Lembras-te de alguma zanga?

Esteve para me dar duas mocadas quando eu e outros fomos afastados da selecção. Já nos tinham avisado para não jogarmos às cartas e uma vez o [seleccionador] José Augusto afasta-me mesmo. Cartas e passas, porque também fomos apanhados a fumar. Tinha 15 ou 16 anos, o meu irmão agarrou-me pelo pescoço e levantou-me um palmo do chão.

Onde passavam as férias de Verão?

Até aos oito anos na praia do Samouco e até aos 17 no parque de campismo da Costa, sempre na tenda. Depois tornou-se impossível fazer campismo. Nos seniores do Sporting já não podia sair à rua e ali era impossível ter o mínimo de tranquilidade.

Como eras na escola?

Até à quarta classe fui um aluno normal. Quando entrei no Sporting, a escola ficou para segundo plano.

Deixaste-a com que idade?

Com 13. Parei no primeiro ano do ciclo. Chumbei por faltas em Janeiro, já era repetente e o meu pai pôs-me a trabalhar como bate-chapas. Estive até aos 15 anos, quando assinei o primeiro contrato profissional.

O que fazias na oficina?

No primeiro dia, cheguei lá e mandei a tinta toda para o fato-de-macaco novo. Ao almoço entrei em casa todo sujo. ‘Estás a ver mãe, já viste o trabalhador que sou, já viste o que fiz das nove ao meio-dia?’. E ela: ‘Ai filho, que orgulho tenho em ti’. Mas que orgulho? Tinha dado três marteladas… [risos].Foi o melhor dia de trabalho como bate-chapas… Tinha orgulho em passear o fato-de-macaco na rua e de o mostrar aos meus amigos. ‘Olha lá para isto, pá! Sou um gajo de trabalho’. Depois fui aprendendo e no fim já conseguia pôr as porradas dos carros no sítio.

Os teus pais davam-te muita liberdade?

Até aos meus 17 anos, às onze da noite tinha que estar em casa.

E cumprias?

Quando chegava mais tarde corria algum risco. O meu pai nunca me tocou na cara, no máximo deu-me uns pontapés no cu. Mas dava-me broncas. Tinha um respeito incrível por ele. A minha mãe já era diferente. De vez em quando levava forte, mas não doía. Com o meu pai bastava ele assobiar à janela para eu ir para dentro. À parte disso, teve sempre uma mentalidade aberta. Muitas vezes a minha mãe apanhou-me revistas pornográficas e ele encobria-me sempre.

Parte 2

Quando chegaste ao Sporting, com 11 anos, pagavam-te alguma coisa?

Só o passe.

Como entraste no clube?

Viram-me num torneio aos 10 anos, mas o meu pai não me deixou ir. Achava uma loucura que eu fosse sozinho para Lisboa.

Como reagiste?

Fiquei triste, mas compreendi. Ele foi muito inteligente: ‘Há ladrões, não posso ir contigo, não há dinheiro para comeres fora, vais chegar aqui às 11 e tal da noite…’. Um ano depois, Portugal fez uma selecção de sub-11 para ir jogar a França. Houve provas em todo o país e fiquei entre os 16 escolhidos. Fomos à final e fui o melhor jogador. No regresso estava o Aurélio Pereira [coordenador do sector da formação do Sporting] à minha espera no aeroporto e foi aí que convenceu o meu pai. E foi aí também que comecei a acreditar que teria futuro no futebol. Logo a seguir fiquei ainda com mais confiança: no primeiro jogo pelo Sporting, sem um único treino, fiz sete golos. Os miúdos são cruéis e ninguém te liga quando chegas, és um forasteiro. Mas isso era antes do jogo. Depois dos sete golos, já era um autêntico líder. Porque parti aquilo tudo. Passados uns meses, o Sporting deu-me 30 escudos por dia para comer um bolo e um copo de leite.

E afinal eras do Sporting ou Benfica?

O meu pai era do Sporting. Naquele tempo, e ainda hoje, era normal seres do clube do teu pai.

Também foste cruel com os miúdos que chegavam a Alvalade?

Dependia. Os que chegavam por mérito defendia-os sempre. Mas o Aurélio tinha uma pressão tremenda, com os pais ricos que queriam que os filhos fossem jogadores. E um dia veio ter comigo: ‘Paulinho, vou meter um miúdo à tua frente, rebenta-o todo’. Os pais estavam na bancada e parti o miúdo todo para perceberem que o filho não tinha jeito. A partir da primeira vez já não era o Aurélio que vinha ter comigo. Quando via um betinho ou alguma coisa esquisita, pergunta-lhe logo: ‘Como é que é, é para partir? [risos]’.

Também no balneário te davas melhor com os miúdos da tua classe social?

Não quer dizer que não te dês com o mais rico, mas parece que há um íman. É como os gajos que fumavam. Quem são os meus amigos de sempre no futebol? Os que fumavam.

Quando é que te estreaste no tabaco?

Aos 12 anos já fumava. Barco. Uma hora no Tejo. Ali comecei a brincar, a fazer bolas [argolas com o fumo] para passar o tempo, e ganhei o vício. Andava sempre com o maço de cigarros escondido nas meias. O meu pai e a minha mãe perguntavam pelo cheiro e dizia que era do barco, que vinha toda a gente a fumar.

Havia muitos miúdos na tua equipa a fumar?

Sim, os da minha classe. Se falas dos mais ricos, não. Se falas dos gajos do Barreiro, todos fumavam.

Quando assinaste o primeiro contrato profissional, em 1981, com 15 anos, quanto ganhavas?

Dez contos.

Era muito para a época?

O meu pai dava-me um conto por semana e metia seis no banco. Aquilo dava e sobrava. Comecei a comprar a minha roupa. Mas a primeira coisa que comprei foi uma aparelhagem a prestações. O meu primeiro disco foi um dos Queen. Ainda tenho essa aparelhagem em Madrid, mas não sei se toca.

Começaste a sentir algum assédio das raparigas?

Só depois de dar o meu primeiro autógrafo, quando me estreei na equipa principal, aos 16 anos. No Montijo já era impossível e aos 17, quando comecei a jogar mais no campeonato, começou o assédio em Lisboa.

Eras um adolescente. Deixaste-te deslumbrar?

Quando te dão uma caneta para assinares o primeiro autógrafo é como te darem uma pistola com cinco balas em seis buracos para jogares à roleta russa. Viste O Caçador, com o Robert de Niro? É igual. Se tens 16, nunca sabes como vais reagir, por isso de 100 há 99 que levam o tiro. Quando pegas na caneta, a primeira coisa que a maioria perde é a humildade. Há milhões de livros e nenhum fala deste tema. Nenhum professor ou psicólogo pode ensinar a lidar com isto, porque eles não dão autógrafos aos 16 anos.

Como é que tu lidaste?

Com medo e respeito. Não queria falhar às pessoas que me pediam autógrafos. Por acaso deu-me para aí. Mas quantos se perdem? No teu meio és o número um do mundo. Os bandidos dos meus amigos estão a ver-me na televisão e quem é que lhes vai dizer para terem calma. ‘Este gajo está na televisão! Este gajo é o maior!’. Com 16 anos não era nada, depois do primeiro autógrafo era Deus. Houve um amigo que jogava comigo desde os 11 anos, e que apanhei também na Selecção, que mudou a personalidade. Tive muitos problemas com ele. Ainda fez uma boa carreira, mas não a excelente que tinha de fazer. Porque era cagão, tinha o rei na barriga. Na Selecção A pegámo-nos à porrada. Não digo quem é porque sou amigo dele e só falo disto como exemplo. Hoje perdoou-lhe tudo. Porque não está escrito como se lida com isto.

Parte 3

Em Alvalade, fizeste uma época na equipa principal e ninguém te perdoou a saída para o FC Porto. Explicaste que recebias 70 contos por mês e ias ganhar 27 mil contos em três épocas?

Sempre o assumi. Tive logo problemas com o Jaime Pacheco e o Sousa porque ainda no Sporting disse: ‘Os da casa não valem nada e os de fora valem ouro’. Eles vinham para Alvalade e viram aquilo como uma ofensa, porque acabei por ir fazer o mesmo para o FC Porto. Quando me viram na Selecção, encostaram-me à parede: ‘Ouve lá, miúdo, então vais meter os adeptos contra nós, a dizer que vimos ganhar ouro para o Sporting? E tu foste ganhar o quê para o FC Porto, prata?’. Queria-me defender e não sabia como. Tinham toda a razão. Foi uma lição. Fui egoísta e não pensei neles.

Como se deu a mudança para o FC Porto?

Estava a passar os piores dias da minha vida. Era um puto alegre, divertido, mas o [treinador John] Toshack já me tinha dito que não contava comigo e na imprensa começava a sair que seria emprestado à Académica. Foi quando apareceu o FC Porto e o Pintinho [Pinto da Costa] me disse: ‘Paulinho, aqui vais ser tu e mais dez’. Logo aí vi a inteligência dele.

E oferecem-te um contrato que reflectia essa ideia…

Não era só o contrato. Era a coragem. Apostaram a 100% em mim. A seguir ao [Fernando] Gomes era o mais bem pago. Estou agradecido para sempre ao Pinto da Costa. A ele devo tudo, porque o Sporting não acreditava em mim.

Fizeste uma contraproposta ao Sporting, inferior à do FC Porto. O que te disseram?

Pedi 18 mil contos por três épocas e responderam que era maluco. Mas há uma lógica. O Armando Biscoito, a pessoa com quem fui falar, pode ter pensado que eu estava a fazer bluff. Muitas pessoas dizem que nunca chegou a falar com o [presidente] João Rocha.

Recebeste ameaças. Como descreves esses tempos?

Foram seis meses horríveis, mais para a minha família do que para mim. Todos os dias atiravam pedras às janelas de casa dos meus pais. Quando vi minha mãe a chorar cheguei a pensar: ‘Vou deixar isto tudo’.

Quem se lembrou de alegares falta de condições psicológicas para romperes o contrato com o Sporting?

Acho que foi o Guilherme Aguiar, o advogado do FC Porto. Foi uma jogada genial.

Nunca sentiste que o Sporting deveria ter recebido alguma compensação?

Na altura era impossível pensar nisso. Não existiam os direitos de formação, tinha 18 anos, estavam a dizer-me que não contavam comigo e apareceu outro clube que me dava não sei quantas vezes mais e que ia apostar em mim. Não pensas em nada mais. Pensas na tua vida. Nenhum ser humano faria diferente. Mas é preciso coragem e eu tive-a.

Nos primeiros tempos andaste escondido no Porto?

Havia o risco de ser sequestrado pelas pessoas do Sporting, porque só seria jogador do FC Porto quando fizesse o primeiro jogo. Vivi em casa do Álvaro Braga Júnior e andava sempre com guarda-costas.

Tiveste algum problema?

Só uma ‘pintadas’ ao pé de minha casa, por ser de Lisboa. ‘Mouro, filha da mãe, não te queremos’. Com adeptos do Sporting, nada. Mas cá em baixo foi tremendo. Só pude voltar ao Montijo no Natal [seis meses depois de ter chegado ao FC Porto].

No balneário do FC Porto olharam-te de lado por seres de Lisboa?

É normal. Havia uma grande rivalidade norte-sul e era um grupo muito fechado. Chegas e vais ganhar mais do que quase todos. Conhecia alguns da Selecção e, quando fui para os cumprimentar no primeiro dia com um abraço, não fui correspondido. Se pudesse, tinha-me pirado a sete pés. Foi como na cidade: tive de os conquistar a pulso. Era odiado no Porto por alguns e em Lisboa por todos os adeptos do Sporting.

4ª parte

Que diferenças encontraste no FC Porto?
No Sporting havia vários líderes. O ‘Manel’ [Fernandes], o Jordão e o Oliveira. No FC Porto havia o Gomes e depois muitos sargentos, Lima Pereira, João Pinto, Jaime Magalhães, Zé Beto, Frasco. E mais abaixo muitos jogadores do norte, André, Semedo, Quim. Ali ninguém entrava, controlavam tudo. Ninguém podia falhar as regras. Todas as sextas faziam um almoço só entre eles. Não iam os de Lisboa nem os estrangeiros. E eu meti na cabeça que tinha que ir ao almoço. No ano seguinte fui convidado.

Só um ano depois?

Sim. E passei a ser sargento. Quando vi que estava com peso, consegui introduzir os estrangeiros e os outros no almoço. Almoçávamos e depois tomávamos café na Praça Velasquez. O jogador do FC Porto é ali rei. Era o único dia em que eu sacava o meu carro, o RS Turbo, só para dar ambiente. Um ano depois já me viam como um deles. Até o sotaque lá de cima já tinha. No campo tínhamos sido campeões e fora dele mostrei que seguia as regras.

Por exemplo?
Se te portasses mal, se fosses apanhado às tantas da manhã a uma quinta ou sexta-feira, era tremendo. Tudo chegava lá dentro. Estavas a ir contra o grupo.

Eram os jogadores a dar a primeira reprimenda?
Claro. ‘Ó filha da mãe’ - ali não há outra maneira de falar -, ‘estás a falhar-nos. Não nos falhes, ******, precisamos de ti para domingo’.

E como lidava a equipa técnica com as quebras de disciplina?
Havia o Octávio [Machado], que era o polícia mau, o cão – sem ofensa porque devo muito ao Octávio –, e o polícia bom que era professor João Mota. Se passasses para cima, ou seja, se fosses ao Artur Jorge, já era gravíssimo. E se depois fosses ao Pintinho, então era muito, muito grave.

Foste muitas vezes ao Artur Jorge?
Muitas. Mas mais em defesa do grupo, a partir do segundo ano, quando já era líder.

Saías muito à noite?
Saía. Mas quando podia. Íamos ao Swing, quando ganhávamos, mas não abusava. Se tivesse que abusar vinha ao Montijo. Normalmente não saía das regras.

Octávio Machado andava sempre de olho em ti?
Era o cão e o gato. Mas adorava-o na parte boa, e ele tinha sempre razão. Só que havia momentos em que eu disparava. Um gajo estava em casa e ele aparecia à meia-noite a tocar à campainha. ‘Que é?’. ‘Ah, já estás aí? Ok’. Uma grama a mais ou a menos de peso era logo motivo para uma discussão do outro mundo. ‘O que é que fizeste ontem, car… não almoçaste?’. Isto era se falhasse uma grama, se fosse um quilo era logo chamado ao Artur Jorge. Não era só comigo, era com todos. Às tantas já ia para o treino a rezar. Pesávamo-nos todos nus, nem sequer havia ali números de meter o relógio no bolso para ajudar.

As tuas maiores pegas foram sempre com Octávio?
Claro. O Octávio era o meu controlador, mas estou-lhe agradecido, porque eu era miúdo e ele fazia de polícia mau. Mas tinha também pegas com outros. Teve uma tão grande com o Madjer que saímos todos dos quartos para ver o que se passava. O João Pinto teve que se pôr no meio dos dois, isto tudo em cuecas. Estávamos proibidos de comer nos hotéis fora do Porto, com o medo que metessem qualquer coisa na comida. Mas às vezes tínhamos fome à noite e corrompíamos os empregados. Se nos apanhava, o Octávio fazia queixa do empregado e a nós dava-nos broncas. ‘Amanhã vais estar de caganeira, se meteram aí veneno como é que é?’. Era uma coisa única. Quando íamos à Selecção, estávamos proibidos de tocar nas vitaminas. Levávamos as nossas. Ele ia ver os treinos e perguntava-me quanto é que estava a pesar. ‘Já tomaste as vitaminas? Já fizeste não sei o quê?’.

O que acontecia quando o Octávio tocava à campainha e não estavas em casa?
Esperava-me.

E quando chegavas?

Se fosse muito tarde, às duas da manhã, dava-me uma bronca. Mas já o conhecia e não abusava. Sabia que depois de terça-feira não podia fazer isso. Mas havia dias que tinha que levar com o Artur Jorge de manhã, que era do pior. Rasgava-me todo.

Era mais duro do que o Octávio?
Porra! Se passavas lá para cima… Com o Octávio era cara a cara. Com o Artur não podias, baixavas a cabeça.

Ao Artur Jorge não respondias?
Responder o quê, fogo! Baixavas as orelhinhas e só ouvias. ‘Agora não treinas. Vai-te embora para casa, desaparece’. Aos gritos.

O Artur Jorge tem uma imagem de alguém mais sereno…

Isso foi depois do Benfica, depois do cancro. No FC Porto era o maior. Mas o maior a sério. Foi um dos maiores que tive.

Conta-nos um episódio.
Um dia fomos jogar a Coimbra e era como uma final para nós. Estávamos a lutar com o Benfica e fomos campeões só na última jornada. O que é que eu fazia muitas vezes? Vinha ao Montijo a seguir ao jogo de domingo – sempre com autorização, não podia simplesmente desaparecer - e depois só havia treino terça de manhã. Na segunda dormia da meia-noite às cinco e arrancava para o treino. Treinava e a seguir dormia a sesta. Para o tal jogo em Coimbra, cheguei atrasado ao primeiro treino da semana. E ele não admitiu. Normalmente dava-me broncas, mas, naquele dia, cheguei lá e disse-me: ‘Vai-te embora, pá, não treinas’. Assim que me disse isso, pensei: ‘Ui, vou já para a cama, maravilha’. Havia treino à tarde e cheguei a horas, mas quando fui ao roupeiro não havia ordem para me darem o cesto. Tive que ir falar com o homem: ‘Vai-te embora, pá, não treinas’. Quarta de manhã, a mesma coisa. Quinta, igual. E eu caladinho. Sexta-feira já havia apostas entre o pessoal. Joga, não joga, é convocado, é titular, vai para o banco. E eu todo lixado.

Foste titular?
Saiu a convocatória e lá estava o meu nome. Que alívio. O treino de sábado de manhã era o mais intenso da semana, com as peladas atrás da baliza. Nos clubes por onde passei, era só ‘calma, não toca’. Ali era ao contrário. Caneleiras até cima, ai minha mãe, metiam-te o pé na cara. O jogo de amanhã? Qual quê? O jogo começava ali. Se te lesionasses, azar. Nesse sábado cheguei lá e a mesma coisa: ‘Não treinas’. No dia a seguir fui titular e fiz um jogo do outro mundo. No último segundo, com o relvado cheio de poças porque chovia torrencialmente, alguém despejou a bola para a frente. Sprintei, toquei na bola antes do Kikas, da Académica, e dei um mergulho, mas um mergulho mesmo a sério. E o árbitro, que estava no meio-campo, marcou penálti. O Kikas nem me tocou, mas só dava para perceber à segunda repetição na televisão. O FC Porto fez o 2-1 e acabou o jogo. No balneário, o Artur Jorge cumprimentou todos um a um. E passou por mim sem me tocar.

Ficaste chateado?
Ele nunca foi de me dizer mais do que ‘bom jogo’. Quando me fui despedir, antes de ir para Madrid, disse-me: ‘Sabes por que nunca te elogiei? Porque tu vais ser o melhor jogador do mundo. Se te elogiasse perdias-te. E quase acertou, fiquei com a Bola de Prata. [a Bola de Ouro de 1987 foi para Ruud Gullit].

É verdade que o FC Porto chegou a pôr uma mulher atrás de ti para te vigiar?

É uma história incrível. Custa-me falar nisso.

Sentiste-te enganado?
Enganado, traído. Se antes tinha um escudo de um metro à minha volta, passou a ser de cem. Tudo o que se aproximava para mim era bicho. Não perdoei a essa mulher. Era uma amiga especial, dez anos mais velha ou mais.

Como descobriste que andava a espiar-te?
Contava-lhe tudo, tinha confiança nela, e depois o FC Porto vinha a saber. ‘Estiveste no Teenagers em São João da Madeira’. Mas como é que sabiam? Ninguém me tinha visto… Contava-lhe o que tinha feito na noite anterior. ‘Estive em casa e dei duas quecas até às três da manhã’. No outro dia já sabiam de tudo no FC Porto. Ainda pensei que tinham metido escutas lá em casa, mas cada vez desconfiava mais dela e montei-lhe uma armadilha. A partir daí passei a ter uma muralha à minha volta. Talvez até me tenha feito bem.

Nunca confrontaste o FC Porto?

Não. Nem podia. Era a minha palavra deles contra a minha.

Meses depois conheceste a futura mãe dos teus filhos. Ainda estavas na defensiva?
Claro. Não só com a mãe dos meus filhos, a Isabel, mas com todas as mulheres que conheci antes de a encontrar. Conhecia-a já depois do Mundial do México, em 1986.

Ele pode ser persona non grata em Alvalade e alguém que apenas pensa em euros/escudos/pesetas; mas é impossível não simpatizar minimamente com ele por causa da sua personalidade (especialmente eu que não sou do tempo em que ele nos trocou pelos dragays).

Já agora, o que foi feito (também a sublinhado) justificava-se muito mais ser feito ao Merdinho. Mas anda tudo displicente, especialmente as claques e ele anda só a festejar 3 títulos que serão 4 hoje como se nada fosse.

Já agora, de quem é que ele fala (sublinhado)?

Essa foto do Jackie Chan é verdadeira?

[size=12pt]Parte 5[/size]

Um dos capítulos da tua biografia põe a nu o que aconteceu em Saltillo, não só os bastidores da greve por causa da discussão dos prémios como das festas privadas com mexicanas à mistura. É uma espécie de mea culpa 25 anos depois?

Claro. A única coisa positiva do México foi que, naqueles tempos de Selecção, os jogadores do FC Porto não falavam com os do Benfica e depois passou a haver união. O resto foi tudo negativo.

Se fosse hoje não defenderias a greve aos treinos?

Não. Estavas no máximo que podes estar. À parte da questão de defender o país, é um tema de dinheiro. Mas não havia dinheiro no mundo que te pudesse levar a fazer o que fizeste. Porque, se o Mundial corresse bem, ias ganhar muito mais em pouco tempo. Todos nós. Mais do que o dinheiro, foi uma questão de orgulho que fez aquela revolta e talvez tenha ficado parvo com o orgulho, por causa da maneira como nos trataram. Mas tínhamos de nos ter controlado. As pessoas vão entender tudo com o meu livro.

Assumes que os jogadores andavam em festas com mexicanas, relatos que também chegavam a Portugal…

Eu era solteiro e não tinha nada que ver com aquilo, mas os casados foram falar com a imprensa, com os gajos que andavam a escrever. Foi um caos. E começaram a sair problemas por todos os lados. Tinha 20 anos e levei uma caixa de pastilhas para não fumar. Era jogador de cartas desde miúdo, só deixei o jogo no Atlético de Madrid, mas como nas cartas fumava levei não sei quantos livros. E disse para mim que também não ia ter qualquer tipo de actividade sexual. Mas foi tudo tão mau que aquilo já não era Mundial, não era nada. O campo de treinos era horrível, uma vez jogámos contra uma equipa de cozinheiros mexicanos ou o que era, que vinham do trabalho. Na primeira folga que tivemos, ah, minha mãe, isto é a vergonha total, que se lixe! E então comecei a desligar da mentalidade que tinha quando lá cheguei.

Tinham eco das notícias que chegavam a Portugal?

Tínhamos. De vez em quando falávamos com a família e também houve um comunicado do [Presidente] Mário Soares, mais ou menos a dizer: ‘Tenham cuidado, portem-se bem que estão a representar Portugal’. Estava lá na parede. Mas estávamos noutro mundo, no meio da desorganização total.

No final quase havia confronto físico entre jogadores e dirigentes da Federação?

O problema grave deu-se quando nós fomos eliminados e deixou de haver carros oficiais da FIFA para eles. Aí tiveram de entrar no autocarro e foi a grande confusão. Houve insultos e é daí que surgiram a maioria dos castigos para os jogadores.

Ficaste dois anos sem ir à selecção.

Não por castigo mas por solidariedade com os meus colegas castigados. Seria incapaz de os atraiçoar. Então os gajos estiveram lá na luta comigo e depois eu ia jogar enquanto eles estavam castigados? O Álvaro [Magalhães] era o meu companheiro de quarto e foi o único que saltou esta norma. E depois ninguém falava com ele na Selecção.

Quando chegaram a Portugal tiveram uma noção melhor das repercussões?

Sim. Mas depois tudo passa. Recordo-me que me isolei numa casa no Algarve, no cu do mundo. Era proibido ligar a televisão, e jornais então nem entravam. Três semanas depois Saltillo tinha passado. Estava no FC Porto e começava outra história.

Parte 6

Que te levou ao título de campeão europeu, em 1987, e depois ao salto para Espanha. Foi fácil o acordo com o Atlético Madrid?

Foi das maiores loucuras. O Gil y Gil era candidato à presidência e não discutiu uma vírgula do que pedimos. Há a história do Porsche que é conhecida, mas tanto eu como o FC Porto podíamos ter pedido o dobro que ele aceitaria. De manhã tínhamos tudo certo com o Inter de Milão e à tarde estava numa discoteca em Madrid com cinco mil pessoas a gritar pelo meu nome. Pedi um Porsche, mas devia ter pedido um Ferrari [risos].

Os teus pais ainda trabalhavam?

Aí fiz a chamada que é das coisas que tenho mais orgulho na vida: ‘Pai, se ele ganha as eleições no domingo, na segunda-feira despedes-te’. E até hoje o meu pai nunca mais trabalhou.

Os teus pais nunca quiseram sair da casa do Montijo?

Quando fui para Madrid, levei-os comigo para a adaptação ser mais rápida. Mas via que eles não eram felizes. Não lhes faltava nada, só o seu ambiente, a sua casa, os amigos. Apesar de estarem numa casa com piscina, preferiam estar no Montijo. A casinha deles era tudo.

Como foste recebido no Atlético de Madrid? Na altura havia poucos estrangeiros.

Não houve más caras. Era um puto, mas tinha sido campeão da Europa e fui recebido como um autêntico craque. Pela afición e pelos meus companheiros. Era só uma questão de o demonstrar dentro de campo.

Depressa te tornaste líder no balneário. Lembras-te de um caso em que tivesses sido forçado a fazer valer a tua influência como capitão?

Posso contar a história do Aguilera, um miúdo que tinha saído da cantera e que depois fez uma grande carreira. Um dia descobriram-lhe um cancro na tíbia, que felizmente era benigno. Antes disso, o Gil y Gil tinha-lhe prometido a renovação do contrato por seis ou sete anos. Foi operado, correu bem e o Gil não ia para a frente, sempre a fugir à renovação. Chegou a altura de eu renovar e disse-lhe: ‘Só vou assinar isto quando o Aguilera assinar à minha frente’. E assim foi. A nível humano, isto não tem preço. Não é como um golo.

A tua relação com Gil y Gil foi muito quente. Eram muito parecidos?

Foi amor e ódio. Ele era o presidente mais polémico do mundo e só uma pessoa teve coragem de ir para cima dele publicamente. Fui tanto para cima dele que, num estudo que fizeram, concluíram que o Atlético de Madrid só vendia mais jornais do que o Real Madrid quando estávamos chateados. Partíamos a loiça toda.

Conta-nos um desses choques.

Ele tinha uma coisa boa. Quando estava bem comigo era ‘Paulo, hombre, que tal?’. Quando estava mal ‘el português, este hirro de ****’. Quando era director desportivo, foi de filho da **** para cima. Não falávamos há algum tempo e ele tinha ido meter um marca-passo [pacemaker] no coração quando fui vê-lo ao hospital. Às tantas pergunta-me sobre a equipa. ‘Alto, venho aqui ver o meu amigo’. ‘Ah, tens razão’. E não falámos da equipa nem do nosso problema. ‘Você não tem cuidado com as gorduras, pensa que tem vinte anos, isto e aquilo’. Só coisas pessoais.

Em Espanha, além de teres ficado famoso pelos teus raides, também ficaste conhecido como grande mergulhador…

Ah, sim, era o número um. Porque arrancava 10 ou 12 penáltis por época.

Mas sofrias falta ou atiravas-te para o chão?

As duas coisas. E muitas vezes era penálti e não marcavam. Era a minha maneira de jogar. Foi a minha intuição de saltar que me permitiu evitar lesões gravíssimas. Consegui durar até aos 27 anos.

Não ficavas com problemas de consciência?

Não, não, não. Ali era para ganhar. Fui o maior e faria tudo igual. Nunca mais apareceu ninguém a cair como eu.

Houve um ano em que os árbitros te derem o prémio de melhor mergulhador.

Sim, o piscinero. Com a minha maneira de cair parecia que tocava, mas não tocava por um centímetro. Muitas vezes só eu é que sabia que não me tinham tocado. Nem as repetições tiravam as dúvidas

Parte 7

Quando regressaste a Portugal, em 1993, vinhas para o Sporting e acabaste no Benfica. O que aconteceu?

Um dia vou estar cara a cara com o Sousa Cintra e perguntar-lhe: ‘Porque é que me fizeste tão mal? Porquê?’. Eu tinha o Benfica e o Sporting. E disse ao Benfica: ‘Obrigado, muito prazer, mas não’. Cheguei a acordo com o Sporting e o Sporting com o Gil. Tínhamos que ir no dia seguinte para Marbelha, em avião privado, e até hoje estou à espera do Sousa Cintra no aeroporto. E depois veio dizer que eu pedi mais dinheiro. Tudo mentira. Passei meses horríveis, sem poder sair de casa, com ameaças. Amigos de infância deixaram de me falar. E eu também nunca lhes vou perdoar. Meteram um clube à frente da amizade de toda a vida?

A tua passagem pelo Benfica correu mal.

Foi azar. Mas também um orgulho incrível. No momento em que pisei Lisboa, já com a camisola do Benfica, vi que era um clube que marca a diferença, uma loucura autêntica. Conheci um homem espectacular, o Jorge de Brito, mas começou logo tudo mal quando foi de demitido o Conselho de Administração da RTP.

Por se ter ficado a saber que o Benfica tinha pago a tua transferência com o dinheiro da venda dos direitos televisivos à estação pública…

Sim. E o Cavaco vai à televisão: ‘Portugueses, vai tudo prá rua por causa da transferência de Paulo Futre’. Não tinha nada a ver com aquilo, mas estava lá metido.

Mas não foi por esse motivo que deixaste o Benfica cinco meses depois…

Estavam a dever dinheiro a toda a gente.

A ti pagaram-te tudo?

A dívida passou para o Marselha, depois para a Reggiana e por fim para o AC Milan.

Era assim tanto dinheiro?

Não me recordo bem, mas nada do outro mundo. Talvez dois ou três meses de salário, só que foi passando de clube para clube.

Estavas com 27 anos e pouco depois sofreste a lesão que acabaria com a tua carreira…

Comecei a sentir dores ainda em Marselha, mas não me podia queixar porque tinha de me pirar dali para fora [veio a público o escândalo de corrupção que atirou o clube para a 2.ª Divisão]. Devia ter limpado logo o tendão rotuliano, mas andei a levar injecções de cortisosa e o joelho rebentou logo no primeiro jogo pela Reggiana. Já no Milão, consultei sete ou oito especialistas, mas todos me diziam que o último a mexer é que iria pagar. Ninguém me tocava. Ninguém me queria abrir. ‘Epá, retira-te’, diziam-me.

Não houve nenhum médico a dizer que te punha bom?

Havia grandes loucuras, tipo tirar o tendão do lado esquerdo para regenear o direito, estar um ano deitado com as pernas para cima, andar não sei quanto tempo de muletas. Não dava. Acabei por fazer uma terceira tentativa em Paris e consegui ser campeão pelo Milão. Fiz um jogo.

Parte 8

No final de 1996, com 30 anos, anunciaste a retirada. Por que voltas a jogar seis meses depois?

Depois de anunciar o abandono, estava na SIC e o Gil y Gil entrou em directo ao telefone. ‘Paulo, quero que sejas o embaixador do Atlético de Madrid, o director internacional’. Era um convite irrecusável, comecei a trabalhar e um dia fui ver um treino de conjunto. Estava como estou agora, a fumar dois maços de cigarros por dia, e sentei-me no banco de suplentes. Veio o [treinador Radomir] Antic e pediu-me para treinar. ‘Falta-me aqui um, vai-te lá equipar’. ‘Está doido ou quê, mister?’. ‘Não te mexes, só para fazer número’. E lá fui eu, sócios e imprensa no estádio. Tinha feito 31 anos e nos primeiros 20 minutos marquei dois golos. Parti aquilo tudo. Estava eu morto no balneário e chegou o Antic: ‘Pá, tens de voltar a jogar’. ‘Está maluco? Amanhã não posso nem andar por causa do joelho’. Mais tarde ligou-me o Gil: ‘Paulo, o que já armaste para aí? Está toda a imprensa a ligar-me. Já falei com o mister, tens que voltar’. No dia a seguir os jornais escreveram que o espectáculo tinha voltado ao [estádio] Vicente Calderon. Passei a levar injecções de produtos naturais no joelho e voltei.

És muito impulsivo?

Sou um gajo corajoso, não tenho medo de enfrentar as situações.

Não há também uma certa inconsciência?

Não é inconsciência, não procurei a situação. Mas se fazes um treino e vês aquele entusiasmo à tua volta… Isto das eleições do Sporting não fui eu que procurei. ‘Ah, quero ser o gajo que manda aqui no futebol’. Não. Estava tranquilo em Madrid. É o destino. Podes é perguntar: ‘Mas porque é que não ficaste parado no campo?’. Foi a bola. Estou com botas? Então vou para cima deles. E depois não havia marcha atrás. Há um ditado em Espanha que diz: ‘Vale mais morrer de pé do que andar de joelhos toda a vida’. Muitas vezes morri de pé.

Vês-te como um bom malandro?

Claro. Sou um homem da vida, não o escondo. Não vou agora dizer que era um betinho. Andei com os bandidos todos e era mais um.

Dá-te gozo desafiar o status quo?

Sempre me senti bem na polémica, à excepção de algumas situações em que passei para o escândalo, como a da tropa.

Quando assinaste pelo Atlético sem teres cumprido o serviço militar obrigatório?

Assinei em Junho sabendo que tinha a tropa em Setembro. Fechei-me em copas. Eu e o Pinto da Costa, que também sabia. No momento da assinatura estava à rasca. Tinha 21 anos e a minha transferência tinha sido a segunda mais cara a seguir à do Maradona. Na primeira semana de Agosto, rebentou o escândalo em Espanha.

Como se resolveu a situação?

Se não viesse à tropa, tinha de estar cinco anos sem vir a Portugal. Uma semana antes fui chamado à embaixada porque o Mário Soares queria falar comigo por telefone. Disse-me que tinho de ir para dar o exemplo. Respondi: ‘Senhor presidente, é uma honra estar a falar consigo, mas vamos entrar em guerra? Se for assim serei o primeiro a pegar na arma’. Três dias depois deu-me o estatuto de atleta de alta competição. Fui o primeiro a recebê-lo.

És religioso?

Tive muitos problemas com a Igreja. Aí está, mais polémica. Assumi publicamente que era casado sem estar casado, o que hoje é normal. Muita gente não se casa, junta-se, e é como estar casado. Eu fui o primeiro. Pelo menos mediático. Tive coragem de dizer: “Meus senhores, não estou casado mas é como se estivesse’. Não me perdoaram. Pior ainda quando fomos pais solteiros, eu e a Isabel, em 1989.

Foste criticado pela Igreja?

Diziam que era um mau exemplo para a juventude, para os católicos e para o mundo. Mandaram cartas lá para casa.

Isso afastou-te da religião?

Ia sempre a Fátima e tinha a minha fé.

Parte 9

O futebol proporcionou-te um bom pé-de-meia?

Sim. Investi bem. Mas não consigo estar parado.

Qual foi a tua compra mais extravagante?

Carros. Que é o pior investimento do mundo. No momento que compras já vale metade. Mas foi mais na juventude, agora já passou. O mais caro deve ter sido o Jaguar, sou um desastre em carros. Custou 70 mil euros.

Recusaste algum clube de topo?

O Real Madrid.

Quando e porquê?

Quando estava no Marselha. No Real Madrid ia ser mais um e acho que não poderia viver em Madrid. Nem naquele momento nem hoje. Senti que fui tão grande no Atlético de Madrid, o maior jogador da história do clube, que não ia poder viver ali. O Figo mudou de uma cidade para outra em Espanha e eu fiz o mesmo em Portugal. Mas se aqui já foi a confusão que foi, imagina em Madrid. Em Portugal ladramos. Em Espanha mordem.

Terias corrido risco de vida?

Eu e os meus filhos.

Chegaste a falar de valores?

Tinha o contrato para assinar em cima da mesa. Mas odiava o Real Madrid. Sou anti. Agora não que está lá o José Mourinho, mas torço por ele, não pelo clube.

Estás fora de Portugal há mais de 20 anos. És patriótico?

Ninguém pode falar mal de Portugal ao pé de mim. Tenho as minhas críticas, agora se vem um espanhol falar mal, por exemplo da crise actual…

Quais são as tuas críticas?

Falamos muito mal de nós e do vizinho. Não há aquela união. Os espanhóis vão sair rápido da crise, têm outra mentalidade. O Sócrates fez a conferência de imprensa [do anúncio do pacote de medidas do FMI] à hora do Barcelona-Real Madrid e o pessoal riu-se. ‘Ei, vê lá o que ele foi fazer agora’.

Falar ao país sabendo que estava muita gente distraída com esse jogo de futebol?

Em Espanha, não o podia ter feito. Respeito a estratégia do Sócrates, o que não acho bem é rirmos disto. Este gajo não pode fazer isto. Os espanhóis fazem as festas, mas quando é a sério é a sério. É a fúria.

Fumas dois maços de cigarros por dia. O coração aguenta?

Só se vive uma vez. O filho do meu melhor amigo, que era como um filho meu, morreu com 26 anos. Era profissional de futebol. Não fumava, não bebia, era o gajo mais são. Começou-lhe a doer a cabeça, fomos ver e era um cancro. A minha lógica na vida é esta: quando tem que te tocar a ti, toca.

És daquelas pessoas que de vez em quando vai ao médico para ver se está tudo bem?

De seis em seis meses vou ver como está a máquina.

O que fazes hoje em Madrid?

Tenho uma empresa de consultoria. Casamos empresas e negócios. Eólicas, construção, tudo. Tenho um sócio espanhol. No futebol estou entre os clubes e os empresários. Faço as pontes, sempre na sombra. Como comentador estou na Marca e colaboro com a Al Jazeera. Escrevo para a Marca em ibérico, uma língua só minha, e depois o meu filho traduz para castelhano. Gosto muito e permitiu-me escrever três capítulos do meu livro sozinho. O da tropa, o do Figo e o do director desportivo.

Qual é a melhor história como director-desportivo?

A do Dani. Foi a vida ou morte para mim. Vendi 14 jogadores e comprei 14. Se o projecto falhasse, hoje não estaria a viver em Espanha. O Atlético estava para descer à 2.ª Divisão B e o Dani foi a minha primeira contratação. Desde os 20 anos que estava queimado e tinha 24 quando o Benfica o suspendeu. Tinha-o conhecido cinco anos antes, quando o Aurélio Pereira me pediu para falar com ele porque temia que se perdesse. Fui jantar a casa do Dani e, se o ouvisses falar, era um santo. No fim pedi licença para fumar e perguntei se alguém queria. O Dani respondeu que o fumo lhe dava vómitos. Depois fui para o quarto com ele e disse-lhe: ‘Ouve lá, miúdo, malandro não engana malandro’. E começámos a fumar. Ele estava no Sporting e perguntei-lhe se queria ser gigolo ou melhor do que eu. Ele respondeu que queria ser melhor do que eu e dei-lhe os meus conselhos, tentando fazer-lhe ver que havia tempo para tudo. Contei-lhe também dos cigarros que fumava quando era jogador: ‘Doze à terça, dez à quarta, oito à quinta, seis à sexta, quatro ao sábado, um ao domingo. Depois do jogo, todos’. Por isso anos depois eu já sabia a fera que estava ali. Quando falei dele a primeira vez ao Gil y Gil, perguntou-me se eu queria converter o Vicente Calderón numa boîte. Um dia antes de ele vir para Madrid, fizemos uma reunião por telefone em alta voz, estava ele com o [empresário José] Veiga e o pai. ‘Dani, quem é o único maluco do futebol que acredita em ti?’. ‘És tu’. ‘Então repete’. E ele: ‘Paulo, tu és o único maluco do futebol que acredita em mim’. ‘Dani, sabes que isto não é a Holanda nem Portugal? Se falhamos aqui os meus filhos podem morrer’. ‘Sim, sim’. Então pedi-lhe para dizer outra frase: ‘Paulo, se eu te falhar a ti e aos teus filhos, autorizo que me dês um tiro no joelho’. E assim começa a nossa longa história, que narro no livro.

Podes ao menos adiantar se a pistola que mais tarde lhe apostaste estava sem balas?

Sim, estava sem balas.