Manipular a democracia

Os mais atentos a estes assuntos da politica terao certamente notado que no passado fim de semana tiveram lugar eleicoes presidenciais na Bielorussia.

O pais em si nao dira muito aos Portugueses, apesar de a capital Minsk se situar a pouco mais de uma hora de voo de cidades como Berlim, Praga, Milao, etc… A Bielorussia e’ o pais mais proximo do coracao da Europa, de todos os 15 estados que nasceram apos o colapso da Uniao Sovietica. Lukashenko governa o pais a seu belo prazer ha 16 anos, preservando a nacao como uma reliquia dos tempos sovieticos, com uma aparente fachada de (algum…muito pouco) liberalismo economico. A Bielorussia e’ uma “mini Uniao Sovietica” de cara laroca.

De 5 em 5 anos Lukashenko organiza eleicoes presidenciais. Digo organiza, porque os sucessivos actos eleitorais sao um epico indescritivel de como adulterar o processo democratico. Lukashenko e’ o guru, o mentor, a entidade suprema no explorar das deficiencias da democracia. Por isso, a cada 5 anos, o ditador monta o circo e os espectadores locais e internacionais assistem ao espetaculo circense da encenacao democratica. No fim uns tantos aplaudem, outros assobiam, a policia trata da saude aqueles que se “excitam” em demasia e o publico abandona o anfi teatro ate 'a proxima encenacao.

Descrever os atropelos ao processo eleitoral na Bielorussia seria fastidiante e quase irrealista. Por isso deixo aqui apenas um exemplo, atraves de um link para um video. Para poupar o uso de um qualquer tradutor online, aqui fica a descricao daquilo que se passa no video:

  • Uma observadora oficial de um posto eleitoral leva com ela uma equipa de TV Belga. (os observadores da oposicao sao apenas 1% do nr. total de observadores eleitorais). A primeira coisa que faz e votar e decide “estragar” o seu voto escrevendo “Lukashenko para Haia”. Depois tenta observar o modo como e feita a contagem dos votos. As imagens falam por si sobre a oportunidade de verificar o acto fundamental da contagem. Por ultimo o presidente da mesa anuncia que existem 3 votos nulos…e mostra-os! Guess what…o voto “estragado” da observadora nao esta entre esses 3 votos. Ela exige que se encontre o voto dela e…surpresa das surpresas, este estava no lote de votos contabilizados a favor de… Lukashenko! Um erro de pormenor? So se formos todos muito inocentes…

[url]http://milka-kotka.livejournal.com/56980.html[/url]

Haveriia muito mais para contar mas deixo aqui as seguintes questoes:

  • Como podemos permitir que este tipo de manipulacoes se passem tao proximo de nos, Europeus civilizados e apoiantes da democracia?
  • A facilidade com que se manipula o processo democratico nao sera suficiente para colocar-mos em causa a democracia como sistema em que vivemos?
  • Que tipo de resposta (dura e efectiva) sera a mais adequada para este tipo de “burlas eleitorais”?

Não precisas de ir tão longe. Na Itália, tens um primeiro-ministro corrupto, com ligações à Máfia, que dá ordens governamentais para que os tribunais não possam investigar essas ligações, que não permite o levantamento da imunidade que goza, para se poder investigar em condições essas ligações, que controla a quase totalidade da comunicação social (principalmente a televisão) utilizando-a juntamente com a tv pública para acções políticas, não dando as mesmas oportunidades à oposição, que interrompe a emissão de programas dessas estações para responder em directo a acusações, etc., etc.

Não conheço bem a realidade da Bielorrússia, mas pelo exemplo que dei, na Itália as coisas não parecem muito melhores. Democracia?? Quando o senado italiano em Março deste ano aprovou uma lei que impede que Berlusconi seja chamado perante a justiça para responder aos processos de corrupção e fraude, pelos quais é acusado? Não sei se neste caso se pode chamar democracia ou… ditadura da maioria.

Portanto, como europeu, estou mais preocupado com o que se passa na Itália, do que aquilo que se passa na Bielorússia. Contudo, apoiarei todos os esforços diplomáticos (e é mesmo “diplomáticos” e não a forma dos EUA fazerem “diplomacia!?!?”) que forem desenvolvidos para que os bielorrussos possam ter um governo como deve ser, que a corrupção que grassa o país seja terminada, e que o povo tenha uma vida melhor.

Bom texto Rasputine.

Tens de te lembrar que o “problema” é que pela Bielorússia passa o Gasoduto Russo (pelo menos um deles de importância significativa) que tanta dor de cabeça tem dado à Europa de um modo geral. Acho que esta meia-palavra chega para se perceber que infelizmente estamos perante o exemplo típico do subjugar da política à problemática económica que se tem vindo a acentuar em muitas situações nas últimas décadas. ???

Liurai,

Obrigado pela resposta. Partilho muitas das tuas preocupacoes relativamente 'a forma como a democracia Italiana funciona (ou nao funciona, melhor dizendo)

Mas em Italia os dirigentes da oposicao nao desaparecem da noite pro dia. Em Italia, 7 dos 9 candidatos da oposicao nao desaparecem durante a noite eleitoral, levados sabe-se la para onde, pelo KGB. Em Italia os apartamentos das pessoas nao sao revistados a meio da noite, nem as pessoas presas em casa enquanto dormem. Em Italia qulaquer um pode vir para a rua e gritar “Abaixo Berlusconi”…em Minsk quem o fizer sera espancado e detido de imediato pela policia.

Existe uma outra diferenca fundamental: nas eleicoes italianas nao tens um exercito de observadores da OSCE, pagos com o dinheiro do contribuinte europeu, para assistir a uma encenacao rude de um processo eleitoral. A Europa envia observadores para as eleicoes Bielorussas para que Lukashenko possa rir na cara dos “civilizados” europeus.

Contra Berlusconi eu posso protestar quando e como quiser. Contra Lukashenko, a realidade e’ tao proxima de um Arquipelago Gulag, que nos, europeus, preferimos virar a cara e esquecer que tal possa sequer existir hoje em dia… a menos de 4 horas de voo de Lisboa!

Paracelsus, obrigado pela resposta.

O gasoduto teria um papel fundamental, nao fosse o caso de as relacoes entre Minsk e Moscovo nao serem as melhores hoje em dia (aparentemente, Lukashenko e Medvedev odeiam-se profundamente). A questao e que a Russia tem findo a financiar o regime Bielorusso atraves de precos subsidiados de gas e petroleo. ( o petroleo e’ depois refinado na Bielorussia e vendido com altas margens de lucro). Apesar disso, a economia local esta num estado decrepito, levando Lukashenko a usar as suas artes manipulatorias para obter apoio do Ocidente ou do irmao russo, de forma alternada. Sem este apoio (muitas vezes encapotado) de um e de outro lado, a economia Bielorussa nao duraria 6 meses.

E alguem quer um pais falido, entre a Russia e a Uniao Europeia?

:great: Então estamos, regra geral, de acordo. Tal como tu, também não gosto de regimes que metam em causa a liberdade do povo, como está a acontecer na Bielorússia, ou neste momento na Costa do Marfim.
Quanto ao Berlusconi, se é um facto que se podem fazer manifestações contra Berlusconi, o controlo que ele tem sobre a CS minora o impacto que estas podiam ter. No entanto, liberdade não é só direito à manifestação. Liberdade é também não sermos prejudicados profissionalmente pelas nossas posições contra o tio Sílvio. E alguns dos juízes e procuradores que têm tentado processar criminalmente o primeiro-ministro têm sido sujeitos a ameaças mais ou menos veladas contra o seu trabalho (e mesmo casos mais sérios), sendo que alguns têm mesmo sido postos de lado.