Exemplos a serem seguidos

“Só vim de Espanha porque era para jogar no Sporting, senão tinha ficado lá.”

Carlos Xavier é um sportinguista ferrenho e não tem medo de assumi-lo. Dos tempos em que jogou de leão ao peito, Carlos Xavier recorda com saudade a equipa maravilha de 81/82 onde actuavam Jordão, Manuel Fernandes, Bastos entre outros. A equipa que nesse ano foi campeã nacional, ganhou a Taça de Portugal e a Supertaça Cândido de Oliveira. Em exclusivo para o Camisola10, eis as palavras de um ex-capitão e ex-jogador do Sporting.

Camisola10 – Com que idade se iniciou nas camadas jovens do Sporting?
Carlos Xavier – Comecei nas camadas jovens do Sporting com 15 anos mas antes tinha jogado no Casa Pia. Vim de Moçambique aos 12 anos, comecei a jogar oficialmente no Casa Pia aos 13 anos e estive lá dois anos. Depois fui para o Sporting em 1977, salvo erro.

Nessa altura já ambicionava ser jogador de futebol profissional?
Não, muito longe disso. O meu pai foi profissional, jogou muito tempo no Benfica de Lourenço Marques e jogou no Casa Pia em Lisboa. Nós, por acaso, em Moçambique praticávamos mais o basquetebol. Também jogávamos futebol mas o desporto típico de Moçambique era o basquetebol. Como tínhamos jeito para todos os desportos, o futebol naturalmente também entrava nas nossas brincadeiras. Quando viemos para Portugal só se falava no futebol e o meu pai foi para o Casa Pia, acabando por nos levar para lá também, a mim e ao meu irmão. Depois, a partir daí, começou tudo numa brincadeira. Fui a um treino de captação no Sporting, com uns amigos, fiz o treino, gostaram de mim e eu fiquei.

Então com que idade é que começou a encarar o futebol com mais seriedade?
A partir dos 16 anos. Vi que estava num grande clube, numa grande escola de formação e acabei por tentar ir o mais longe possível. Nessa idade, o irmos o mais longe possível era tentar passar a barreira dos juniores para os seniores. Foi isso que eu consegui mais dois colegas, o Mário Jorge e o Paulo. Conseguimos subir aos seniores e ficámos.

Nessa altura, quais eram as suas referências no futebol?
Eu tinha três, nessa altura, e felizmente joguei com os três. Um era o Vítor Damas que já quando eu estava em Moçambique gostava muito dele e gostava de imitá-lo. Depois os outros eram o Manuel Fernandes e o Jordão.

Chegado a sénior, que dificuldades encontrou para se integrar?
Nessa altura não era muito difícil a adaptação porque a equipa era formada praticamente por portugueses. Aliás, só havia um jogador estrangeiro, o Meszaros que era um guarda-redes húngaro… talvez também um ou outro brasileiro. A equipa era formada com jogadores “feitos” na casa. Como o Bastos, o Manuel Fernandes, o Zézinho, o Damas, o Jordão já tinham muitos anos de vivência no clube e eles transmitiram-nos a mística do Sporting o que nos facilitou imenso. Fomos acarinhados por eles, obviamente que o nosso objectivo era trabalhar para um dia mais tarde podermos jogar. Não era tão fácil como hoje em dia. Havia menos jogos nas camadas jovens e, nesse sentido, as coisas correram-me bastante bem. A mensagem era fácil de absorver e figuras como o Bastos, o Jordão e o Damas tornaram o processo mais fácil.

Qual é a equipa do Sporting do seu tempo que recorda com mais saudade?
Recordo-me de todas mas obviamente que no meu segundo ano de sénior, a equipa que foi campeã foi a que mais me marcou, onde basicamente só havia portugueses. Tínhamos três jogadores que faziam a diferença: o Manuel Fernandes, o Jordão e o Oliveira. Era um grupo muito trabalhador e depois havia uma união de grupo muito grande. Recordo-me nesse ano, todas as semanas tínhamos encontros em que os todos os jogadores almoçavam para manter o espírito. Naturalmente que o grande responsável por esse ambiente de união e sucesso foi o treinador Malcolm Allison, que foi dos melhores treinadores que tive no Sporting.

Falando em treinadores, para além do Malcolm Allison, que outros o marcaram mais como homem e futebolista?
Recordo-me muito bem do meu primeiro treinador, quando cheguei ao Sporting, o Sr. César Nascimento, das camadas jovens. Depois apanhei o Fernando Mendes, que ainda hoje é uma figura do clube. Os que mais me marcaram foram o Malcolm Allison, que me lançou na equipa principal, o John Toshack, o Marinho Peres e alguns mais. Não me recordo de todos os que me marcaram pela positiva.

Quando deixou o Sporting para jogar em Espanha, quais eram as suas expectativas?
Fui para Espanha numa altura em que já não pensava ir. Tive para ir antes… Na altura em que o Toshack teve no Sporting quis-me levar a mim, ao Oceano e ao Litos para o Real Sociedad só que o clube não aceitava jogadores estrangeiros. No ano seguinte, o Toshack saiu do Real Sociedad, foram três jogadores ingleses para a Real Sociedad e aí abriram as portas. Quando regressa a San Sebastián, em 1991, o Toshack volta à carga e vem buscar-me a mim e ao Oceano. Lá fomos os dois numa aventura muito enriquecedora mas com um futebol muito diferente.

Que dificuldades teve de enfrentar quando esteve em Espanha?
O tipo de futebol praticado em Espanha era muito melhor. Os estádios sempre cheios, um ambiente fantástico e é por isso que a liga espanhola é considerada uma das melhores da Europa. Fui com a minha mulher e com o Gonçalo que tinha três meses. A habituação foi fácil porque estava com a minha família. Para nós jogadores a adaptação era mais fácil do que para as nossas famílias. A minha mulher deixou os amigos todos, só me via depois do almoço e do treino e pouco se fazia. Ela, de vez em quando, vinha matar saudades a Lisboa mas o primeiro ano foi o que mais me custou. Ainda por cima tive uma lesão logo no início da época, tive sete jogos sem jogar e essa fase não foi fácil de ultrapassar. Depois começaram a surgir os jogos, comecei a ganhar ritmo, a jogar bem e até ao final do contrato foram três anos inesquecíveis.

Que tipo de sentimento teve quando regressou depois ao Sporting?
Foi o regresso a casa. Aliás, eu só vim de Espanha porque era para jogar no Sporting senão tinha ficado lá. Na época, disse que se saísse do Sporting, neste caso fui para Espanha, quando regressasse a Portugal nunca jogaria numa equipa adversária do Sporting. Quando regresso a Portugal venho para o Sporting e quando saí do Sporting tive vários convites mas nunca quis continuar porque não me sentia à vontade para jogar contra o Sporting. Foi o regresso a casa e foi o “morrer” em casa.

Nesse tempo havia mais amor à camisola? Os jogadores sentiam mais o emblema que representavam?
Hoje em dia o futebol é uma indústria. Os jogadores hoje estão num clube e passados seis meses estão noutro. O dinheiro é que manobra tudo. Naquela época não havia tantos empresários, tantos interesses, não havia tanta comunicação social a dar ênfase ao futebol e aos jogadores. Hoje em dia quase ninguém vive sem o futebol. Até acho incrível as mulheres comprarem jornais desportivos. Há uns anos atrás isso era impensável. Hoje em dia é muito difícil um futebolista jogar num grande clube e ficar lá muitos anos. Se é bom há sempre cobiça de outros clubes, se é mau tem de ir embora. Há sempre amor à camisola, não há é que aquele sentimento de querer ficar, ou seja, “vou para outro clube ganhar mais mas se calhar não vai compensar e por isso fico aqui”. Ainda há amor à camisola mas o dinheiro fala mais alto.

Tendo sido um jogador polivalente, entende que isso lhe trouxe algumas vantagens?
Por um lado sim, por outro lado não. Preferia ter-me fixado num lugar onde pudesse desenvolver todas as minhas valias e render ao máximo. Senti isso realmente quando fui para Espanha três anos e joguei na posição onde gostava mais, que era a número dez. Atrás dos avançados, no meio-campo, a organizar jogo. No Sporting, joguei a lateral e a central. Há quem diga que gostava de me ver como lateral. Joguei a lateral adaptado, embora para mim um lateral tenha de ser um jogador que vai e vem. Eu, às vezes, era mais o vai e fica. Sobretudo no tempo do Toshack, jogávamos com cinco defesas, três centrais e dois laterais a subir. Aí gostava de ser lateral porque estavam sempre três “polícias” lá atrás a comandar e isso permitia-me estar sempre a atacar e eu gosto de jogar ao ataque.

Quais são, no seu entender, as características que um camisola dez deve ter?
Para já, tem de ser muito inteligente. Para mim, o camisola dez, é a posição do jogador que tem de estar sempre alerta, sempre de prevenção. Quando tem a bola nos pés tem de saber sempre o que vai fazer. É um jogador que tem de pensar rápido e executar rápido também. Dou o exemplo, que é um jogador n.º dez que admiro muito, gosto de vê-lo jogar e que infelizmente não joga no meu clube, que é o Rui Costa. Ele é realmente um forte número dez. Gosto de ver um número dez a jogar para a frente, para o ataque. Na altura, o Balakov fazia muito bem essa função mas o número dez tem de ser agressivo. Joga ali numa zona difícil, atrás dos pontas-de-lança, perto da área e depois se for um número dez que chuta bem mais valias a equipa tem. É sobretudo um jogador que tem de pensar rápido nas jogadas que vai fazer. Depois tem de ser um jogador dotado tecnicamente.

Tendo tido uma carreira recheada de êxitos, inclusive chegando a ser internacional, pensa que abandonou o futebol no momento certo?
Eu era para ficar mais um ano no Sporting mas houve um “cambalacho” no meio e foram depositar as culpas em cima do Waseige, um belga que veio e que disse que eu não ficava. Disse que tinha visto umas cassetes. Mentira! Não há cassetes nenhumas. Aquilo já estava tudo pensado, entre o treinador e o director desportivo e depois quiseram “tapar o sol com a peneira” mas eu não sou burro. Sei quem são os responsáveis por isso. Podia ter ido para outro clube e acabei a minha carreira com 34 anos.

Que opinião tem da actual aposta do Sporting nos atletas formados no clube?
Esta aposta já vem de há muitos anos. Se recuarmos há uns anos atrás, o Sporting sempre apostou muito na formação, agora com mais credibilidade com a existência da Academia de Alcochete. É mais fácil formar mais jovens e hoje em dia vemos miúdos que são de outros clubes e querem ir jogar para o Sporting. Gostam de ir para o Sporting porque é uma escola muito conceituada, de onde todos os anos saem bons jogadores e de onde saíram dois grandes futebolistas nacionais. Um já foi considerado o melhor do mundo [Luís Figo] e o outro está a caminho disso [Cristiano Ronaldo]. Penso que isso é um motivo de orgulho para quem trabalha no Sporting. Faz inveja a muitos outros clubes mas é preciso trabalhar com vontade e conhecimento. Nesse sentido, o Sporting sempre soube funcionar bem e sempre teve uma área de prospecção muito boa. Agora com o lançamento destas novas escolas vai conseguir canalizar ainda mais jogadores. Acho muito bem que a aposta da direcção passe pela formação, que é aí que está a riqueza do clube.

De todos os jovens talentos que jogam actualmente no plantel principal do Sporting, qual deles é que destacaria?
Geralmente não gosto de individualizar porque a equipa é formada por um todo. Os que têm jogado, o Nani, o Moutinho, o Djaló e o Miguel Veloso, estão no mesmo patamar. O João Moutinho destaca-se num aspecto, o Nani noutro, o Miguel Veloso noutro… cada um com a sua característica própria. No entanto, quem tem sido mais regular e tem um grande futuro pela frente é o João Moutinho. Vai ser certamente mais uma das referências do Sporting.

Gostava de ter ficado mais ligado ao Sporting do que está realmente hoje em dia?
Agora no meio em que estou a trabalhar nas escolas de formação, já me sinto mais ligado ao Sporting. Sempre estive ligado ao Sporting, estando lá dentro ou não. Com este novo projecto que o Sporting lançou, obviamente que não pude dizer que não. É neste ambiente que me sinto à vontade e ainda por cima trabalhar com o Sporting é sempre motivo de orgulho e motivação.

Texto: Ana Filipa Lopes
Fotos: Camisola10

=D>

O C. Xavier sempre mostrou ser um grande Leão!

Nunca me vou esquecer da jogada que ele faz na final da taça contra o marítimo em 95(?) simulação perfeita junto à lateral direita, cruzamento e Yorda a facturar!! Foi o primeiro troféu em 13 anos :oops: e o último jogo de Figo e Balakov com a nossa camisola (que saudades do Bala!!!).

Carlos Xavier foi sempre um dos meus jogadores favoritos.
Alem de ter sido um bom jogador,ama o Sporting foi sempre fiel ao Sporting, e um Homem.

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grande homem e grande jogador,só foi pena ele ter saido do sporting como saiu,dispensado quando todos os criticos e sportinguistas diziam que ainda fazia mais uma época de alto nivel no sporting,

temos mais exemplos
oceano,tambem deixou espanha para jogar no nosso clube
sá pinto,que fez o mesmo,

estes são exemplos de verdadeiros jogadores sportinguistas que não se importaram de vir ganhar muito menos por amor ao clube

Grande jogador e grande sportinguista. Boa entrevista. =D>

O especialista da marcação de livres. Grande Sportinguista e grande senhor. =D> =D> =D>

Grande Carlos Xavier.
Especialista na marcação de livres,um livre directo era quase um penalti.
Lembro-me dum jogo em Chaves creio que em 95/96 em que ele evita a derrota da nossa equipa com um golo de livre.
O jogo só acabou mais tarde jogando-se os últimos dois minutos,salvo erro,porque falhou a luz.

Tem um cachecol igual ao meu… Campeão 99/2000 :smiley:
Se voltou foi porque saiu… (já estávamos na CEE) não é isso que lhe dá mais ou menos mérito, um grande profissional, um bom jogador, e reparem no que ele diz sobre o futebol em Espanha…, hoje em dia não é mais fácil como ele diz, há sempre prós e contras, o futebol é mais duro e rápido, há mais ambição e ganância, os clubes são empresas, e os jogadores têm que zelar pelos seus interesses e ambicionar serem dos melhores do mundo, os que podem claro!
De qualquer maneira sempre gostei deste jogador e admiro a sua integridade!
Já agora reparem nos putos que ele nomeou, e como refere que cada um tens as suas próprias características que os distinguem da média, eu acho que ele vai espreitar os treinos… :wink:

adorava o C Xavier. os passes dele eram perfeitos. Que saudades.

um dos meus idolos 8) adorava a sua forma de jogar =D>