Lá fui eu. Tinha conseguido bilhetes de central a 150 euros (custavam 100) não era justo privar-me de ver uma coisa destas, que acontece uma vez em várias vidas (final na própria casa) por causa de supertições.
Ia já equipado, camisola, dois cachecóis, a doente mais que tudo tinha atravessado a cidade para me levar o "material". Saindo do escritório todo o piso me desejou boa sorte. No caminho mentalizava-me… “é uma final, jogo de sorte ou azar”…“já é bom ter chegado à final”… “quem perde com equipas com o benfica actual tem de ser humilde”… enfim, a panóplia de raciciocínios e lugares comuns que certamente muitos outros pensaram.
Cheguei ao estádio, encontrei-me com o Raimas, parceiro de bilhete e amigo de muitos anos. Antes de entrar ainda tempo de encontrar os suspeitos do costume: Coração, Felina e mãe. Troca de impessões, discussão da opção Rogério e lá fomos nós. Um cachorro e sentámo-nos.
Enquanto o tempo passava procurava-se os voodos da treta… “olha, entraram primeiro para o aquecimento, como a Espanha… vão levar na boca”… “mas a nossa claque é que está na bancada dos espanhois cabeçudos, será que vamos comer nós?”…
Onze inicial, primeira torcidela de nariz. “Barbosa de início outra vez? Cartada queimada? Este gajo não aprende?”… “Rogério? Sempre que jogámos com rogério no miolo levamo-la bonita…” O Raimas tranquilizou-me “é para fechar na direita que eles jogam com alas”. Fazia sentido.
O jogo começa, Sporting a carregar e jogar bem. Sá despassarado mas esforçado. Rogério estava a cumprir bem o que o Raimas dizia, apoiava ora no meio ora na direita, mas quando eles atacavam fechava e ajudava Garcia. Veio o golo e foi a festa. “Há que marcar outro rápido senão já se está mesmo a ver”, enquanto o Raimas dizia “não podemos recuar”.
Ao intervalo troca de impressões. Digo eu “devia tirar o Rogério que já acabou a primeira parte a arfar e meter o custódio, e depois tirar o Sá e meter o Douala para aproveitar o facto de eles subirem e deixarem aqueles buracos entre os centrais, já que de qualquer forma o Sá está a correr mas está mto trapalhão”. O jogo começou e as subs não chegavam “não sejas burro… .não sejas burro… não sejas burro…” nada parecia ajudar… aqueciam homens ao longe mas… nada…
Livre junto a nós “ui, um livre a pingar para a área. Foi assim na luz”. Pum. O golo do costume, o golo da estatística. Raimas comenta que foi assim que levámos 70% dos golos. “Isto vai complicar” pensei eu… o tempo passava e de Peseiro nada…
Segundo golo russo. A hecatombe. Enquanto isso eu dizia “já viste que comemos 1,2 e o russo ainda vai mexer antes do peseiro?!” Estava completamente incrédulo. Finalmente uma substituição… niculae por Sá Pinto… “que noite infeliz Sá Pinto, mas correste”…
Pelo caminho tinham ficado os dois pedidos ao pai natal: custódio e douala, já não faziam sentido… a balança de forças mudara.De repente parecia golo! Não foi! Contra-ataque, 1,2,3 deles e apenas um nosso! “Onde estão os nossos jogadores?! Vai enak… não enak!..”. Golo.
Acabou, pensei. “no 2-1 ainda dava para sonhar com um empate mas agora os russos não vão ser comidos, este treinador não é estúpido”. Entra Douala e sai Rogério. “Agora?” pensei… “agora que o kuala não tem o espaço que precisa? Para quê?”. O russo ainda mexe mais duas vezes, aproveitando plenamente o que lhe é possível fazer do banco. De repente aí está a sua obra, que vinha construíndo desde o primeiro golo… uma muralha inexpugnável e já nem os perigosos cruzamentos da fase anterior do jogo surtem qualquer efeito perigoso. Um redil. Uma lição. Um banho táctico completo.
Ainda entra o meu mais que tudo..“ui vem aí o vianinha, mas quem vai ele tirar?” o puto?! bah… também… agora, que é que interessa. “Pode ser que o viana acorde e meta dois mísseis cá de longe”… esbofeteei-me mentalmente por tamanha infantilidade de raciocínio.
Fim do jogo. “o que apontar aos jogadores? deram tudo, correram, correram…”… lá fiquei a aplaudir. Gritei Sporting, puxei pelos cânticos mas de facto tinha azar, tinha ido parar a uma bancada dos chamados “sobrinhos e primos da oligarquia”, aqueles sportinguistas de cabelo disciplinadamente encaracolado que fuma charuto e vai de pullover em V… metade deles já tinham saído ao terceiro golo (devia ser pressa de chegar a casa para algo importante) a outra estava sentada nas cadeiras e nada ajudava. “Má sorte” pensei… “tou na bancada dos verdadeiros betos estes gajos já não batem mais uma palma que seja”…
Aplaudi até ao fim. Aplaudi também os russos, afinal mereciam, sobretudo o seu treinador. Tive ainda alguma dificuldade em levantar um amigo (que não o Raimas) da cadeira, parecia não querer sair dali, a mirar o infinito. Fomos buscar outro a chorar mais acima. Que tristeza.
Metro para casa e computador ligado. Uma enorme tristeza e uma conclusão: o Sporting é o maior desperdício, por razões várias, de capital e riqueza humana que tenho conhecimento. Nunca vi tanta gente de tanto valor sofrer tanto por algo que lhes dá, por razões várias, tão pouco retorno e felicidade. Enfim…
(ps - desculpem pontuação e aspas possivelmente confusas, não tive paciência nem ânimo para rever)