As mudanças sociais são, na maioria dos casos, fruto de dois factores: o contexto e o emergir de uma figura icónica (ou várias). Com a palavra contexto refiro-me a uma alteração no pensamento colectivo, que proporciona o germén necessário para o aparecimento de ideias contrárias às vigentes. A palavra ícone simboliza a personificação de toda a matéria mental abstracta numa figura concreta, de carne e osso, onde as pessoas projectam os seus desejos e vontades.
Nas últimas eleições do Sporting, estavam reunidas estas condições: a ideia de continuidade não era, de todo, aceite pela maioria dos sportinguistas e vimos surgir um candidato que personificava o anseio de mudar. A maioria dos sportinguistas activos, que estão presentes quotidianamente no estádio e nos vários pavilhões deste país não queriam “mais do mesmo”. Várias figuras importantes do Sporting também manifestaram o seu desejo de mudança, como Eduardo Barroso, Daniel Sampaio, Dias Ferreira, José Eduardo, Fernando Correia, entre os outros que sempre estiveram, ao longo destes anos, do outro lado da barricada na luta contra o poder oligárquico instalado no Sporting.
Nas eleições de 26 de Março, tal mudança não foi possível. Não irei discorrer sobre possíveis fraudes eleitorais, porque não há certezas e prefiro esperar pelos próximos dias antes de fazer qualquer tipo de vaticínio. No entanto, há um dado objectivo: a maioria dos votantes escolheu o candidato Bruno de Carvalho, com uma diferença de 1500 sócios em relação ao segundo classificado no acto eleitoral. Só que, dados os presentes estatutos, existe uma enorme discrepância entre o número de votos dos sócios mais antigos e dos mais recentes. Uma diferença que chega aos 25 para 1. O resultado desta situação é termos um clube onde o presidente eleito não corresponde à vontade da maioria associativa. Não se pode falar em “presidente eleito democraticamente” quando este fenómeno ocorre. É uma pura aberração e a verdadeira causa para toda esta guerra civil que temos vindo a presenciar nestes últimos dias.
Assim sendo, é vital a alteração dos estatutos. O Futebol Clube do Porto, por exemplo, tem desde há muito um sistema eleitoral que dá um voto a cada sócio, tenha um ano de associado ou cinquenta. Compreendo que esta medida pode parecer excessiva para alguns, mas existem alternativas lógicas, como a que aqui proponho: para cada dez anos de sócio, mais um voto, sendo que este valor não poderá passar dos cinco. Ou seja, um sócio com vinte anos de filiação terá três votos e um que tenha quarenta anos chegará ao limite máximo com cinco votos. Desta forma, a diferença é esbatida e o sistema torna-se mais justo, podendo ser mais facilmente aprovado por maioria numa assembleia geral.
No fundo, estas eleições mostraram o erro dos estatutos actuais. Mostraram que é possível eleger um presidente minoritário. Mostraram que as razões para a guerra instalada são legítimas e não irão acabar tão cedo. Mostraram que quando um líder não representa a vontade da maioria que o elege, estão criadas as condições para uma revolução violenta.
Uma eleição democrática é fraudulenta quando os resultados não traduzem a vontade da maioria. E foi exactamente isso que ocorreu no dia 26 de Março.
@Winston Smith