Como não sou psicólogo, sociólogo ou outro «ólogo» qualquer, não me cabe a mim analisar qualquer movimento social de massas sob o ponto de vista eminentemente técnico. Gostaria no entanto de tecer alguns considerandos a respeito dos grupos de contestação de cariz minoritário e da forma como os mesmos são interpretados. De um modo geral, são vistos como pouco representativos, sem grande expressão e até causadores de algum incómodo: «São meia dúzia de energúmenos» – afirmam uns; «São apenas uma minoria de desestabilizadores» – acusam outros. O que é facto, é que não raras vezes essas forças minoritárias corporizam a vontade de muitos milhares, que bem se podiam apelidar de… «maioria silenciosa». Quantos de nós não nos revimos já numa atitude de protesto levada a cabo por uma reduzida quantidade de manifestantes?
Para ilustrar a minha posição, vou viajar um pouco no tempo até à época de 1999-2000, quando o Sporting era treinado por Giuseppe Materazzi e quando finalmente foi quebrado o jejum de 18 anos de títulos. Lembro-me perfeitamente daquela tarde em que, após uma série negra de péssimos resultados, o clube jogou em casa com um adversário perfeitamente ao seu alcance e voltou a obter um resultado nada condizente com os seus pergaminhos. No final da partida, alguns elementos da JL – Juventude Leonina (cerca de 25 - 30), aguardavam José Roquette ao fundo das escadas que davam acesso ao camarote presidencial e quando o ex-presidente do Sporting se aprestava para abandonar o estádio, as poucas dezenas de membros da JL começaram a gritar palavras de ordem e de protesto contra a insustentável situação desportiva do clube. De pronto, José Roquette proferiu algo como isto: «Comigo, o poder não cairá na rua. O clube não será gerido de fora para dentro». Com estas palavras, Roquette pretendia insinuar que o Sporting não seria condicionado por uma «minoria» que protestava energicamente, mesmo tendo ele consciência que esses protestos, para além de terem razão de ser, davam voz à indignação de milhares de associados. Entretanto, o resto da história é conhecida – Roquette cedeu e o Sporting trocou de treinador a meio da época, com os resultados que todos conhecemos.
Mais recentemente, vários sportinguistas cujo amor e dedicação ao clube não deviam sequer ser postos em causa, foram mimoseados com adjectivos pouco consentâneos com uma Direcção desportiva que se preze, pelo simples facto de porem em causa o projecto desportivo (ou a inexistência do mesmo), de acusarem a Direcção de falta de paixão e fervor clubista e de a responsabilizarem pelo descrédito e divórcio crescente dos adeptos para com a equipa de futebol. Se é de «proscritos», de «desestabilizadores» ou de «falsos sportinguistas» que estamos a falar, também posso inferir que a eleição do actual presidente do Sporting Clube de Portugal, poderá ter contado com o apoio de «um bando de energúmenos», uma vez que do universo de associados leoninos, apenas uma pequena fracção esteve presente nas urnas e nem todos votaram no vencedor – estaremos então a falar de uma eleição com minoria absoluta.
Para que conste, nem sempre as minorias contestatárias representam um pequeno movimento de massas sem grande significado macro-social. Muitas vezes, constituem mesmo… a ponta visível do icebergue.