
Sim, e agora?
Por muitas cortinas de fumo que a maquina de propaganda lampionica possa lançar, estamos num ponto de não retorno do futebol português. O caso dos emails coloca tudo em causa. Essa é, aliás, uma das razoes pelas quais os painelistas, comentadeiros e afins tentam ao máximo fugir da discussão do essencial: os emails revelam que o futebol português, em termos organizativos, está podre de alto a baixo.
Não vale a penas estarmos a desperdiçar tempo com questões laterais. Não interessa se aquilo que foi revelado serve como prova em tribunal. Não interessa se em termos legais se designa por trafico de influencias ou corrupção. É absolutamente irrelevante que a maioria dos lampiões assobie para o ar e finja que não se passa nada. A informação já divulgada abala tudo, coloca tudo em causa e indicia um verdadeiro polvo mafioso com tentáculos que vão muito para além do desporto.
Aos cépticos, convém que se deixem de tretas:
- Nunca, em circunstancia alguma, um elemento do dirigismo arbitral deve discutir questões relacionados com esse tópico com um colaborador/ elemento de um clube, seja ele qual for. Mais: nem sequer devem trocar correspondência, usando emails institucionais. Ponto.
- Nunca, em tempo algum, um delegado da liga deve trocar emails com um dirigente de um clube, que não sejam estritamente do foro da correspondência institucional. Jamais um delegado da liga pode querer ser o "menino querido" de qualquer clube. Nem sequer é especialmente relevante o teor das conversas. São questões de principio e de carácter ético.
- Nunca um presidente da AG da liga de clubes deve fornecer informação privilegiada a qualquer clube. Muito menos quando essa informação pode fragilizar o actual líder da FPF. Trata-se do principio básico de igualdade no tratamento dos clubes.
- Nunca um presidente da Liga pode ter linguagem subserviente para qualquer um dos clubes membros. Não interessa qual o tópico em discussão, jamais deve acontecer.
Em resumo: por mais que se tente desviar a conversa do essencial, o teor dos emails revela, acima de tudo, um clima geral de compadrio e subserviência total aos lampiões (por parte de sectores chave no futebol português) que é absolutamente inaceitável. Para chegar a essa conclusão, não é necessário ser jurista, policia ou comentador desportivo. Basta ter senso comum.
Não sabemos o que vai acontecer a seguir no desenrolar deste escândalo. Mas sabemos que o inicio das competições oficiais se aproxima e algo tem de acontecer para que estas decorram com o mínimo de normalidade. Podemos, no entanto, especular sobre o que aí vem, adiantando alguns possíveis cenários:
-
Vai tudo preso e o SLB é despromovido. Este seria o cenário mais provável num país a sério. Em Portugal, parece ser uma possibilidade utópica. Por mais provas que se apresentem, o clube do regime aparenta ser intocável. Por mais que as leis sejam violadas ou ignoradas, existe uma espécie de "red pass" politico que, qual jogo do Monopólio, os liberta da prisão e coloca na casa da partida;
-
Tenta-se uma solução salomónica "à boa maneira Tuga". Uns castigozitos aqui, umas multas acolá, umas suspensões da treta e finge-se que o assunto foi tratado e resolvido. Fazem-se discursos muito sérios sobre credibilidade e transparência mas, no fundo, todos sabem que o futebol voltará a se afundar no pântano do jogo de interesses lampianico. Uma tentativa de deixar todos satisfeitos sem mudar nada;
-
Deixar o burburinho morrer e dar inicio às competições como se nada tivesse acontecido. Esta opção, ideal para os lampiões, encerra graves perigos. A suspeição pendente sobre os árbitros individualmente, órgãos da Liga, órgãos da arbitragem e órgãos de justiça desportiva é insustentável. Com níveis de desconfiança intoleráveis, qualquer evento, por menor que seja, pode gerar um efeito dominó, que facilmente pode resultar numa tragédia. O assunto é demasiado sério para ser ignorado e não se recomenda que potenciais medidas sejam tomadas apenas quando algo de muito grave acontecer. Julgo que nenhum agente do futebol quer ter sangue nas suas mãos...
Chegados a este ponto, não podemos negar que o futebol português se encontra numa encruzilhada: é tão perigoso fazer alguma coisa como não fazer nada. É demagógico pensar que se pode limpar a porcaria que corrói toda a organização futebolística num espaço curto de tempo. Por outro lado, competir num cenário de corrupção e tráfico de influencias é um exercício fútil de auto-flagelação. O que fazer?
Sim, o que fazer?